Crime e Justiça
No fogo cruzado: Indígenas da fronteira entre Colômbia e Equador enfrentam violência de cartéis
Comunidades indígenas na fronteira entre Equador e Colômbia enfrentam escalada da violência, à medida que organizações criminosas apertam o cerco, forçando jovens a ingressarem nos seus quadros, transformando aldeias em escudos humanos e espalhando o medo em terras ancestrais.
![Mulheres equatorianas da etnia Kichwa Kayambi fazem fila para votar durante segundo turno das eleições presidenciais em Cangahua, em 13 de abril. [Luis Acosta/AFP]](/gc4/images/2025/04/23/50130-ecuador1-600_384.webp)
Por Catalino Hoyos |
QUITO/BOGOTÁ – As comunidades indígenas ao longo da fronteira entre o Equador e a Colômbia estão sob a ameaça crescente de pelo menos 11 organizações criminosas ligadas ao tráfico de drogas, que se infiltraram em seus territórios ancestrais.
O recrutamento forçado de indígenas equatorianos por estes grupos se tornou uma grave preocupação para as organizações indígenas e organizações não governamentais, bem como para instituições nacionais e internacionais.
As comunidades indígenas da fronteira entre Equador e Colômbia estão sofrendo graves violações de seu direito de viver em paz e segurança, disse ao Entorno Enoc Merino, analista e membro da Fundação Kichwa Yaku Supay Runa. Esses direitos “precisam ser garantidos”, enfatizou ele.
“É um cenário sombrio para os povos indígenas da fronteira”, alertou Merino. “Eles estão sozinhos nesta luta; tudo o que podem fazer é resistir e encontrar maneiras de sobreviver, como têm feito há mais de 500 anos.”
![Soldados colombianos patrulham El Diviso, no departamento de Nariño, em agosto passado. Os Awá, um dos grupos indígenas mais ameaçados do país, vivem em territórios de floresta tropical há muito visados por grupos armados. [Joaquin Sarmiento/AFP]](/gc4/images/2025/04/23/50131-awa-600_384.webp)
A presença crescente de grupos armados ilegais está prejudicando os modos de vida ancestrais e destruindo a estrutura social tradicional dessas comunidades, disse ele.
“Eles já não têm a liberdade de percorrer pacificamente seu território para se relacionar com os seres da selva, com seus espíritos protetores”, lamentou Merino.
Estas organizações criminosas não só recrutam à força os indígenas, como também os obrigam a praticar lavagem de dinheiro, prostituição e até mesmo assassinatos, disse Merino.
Em muitos casos, os bandidos utilizam comunidades inteiras como escudos humanos para dissuadir as operações militares das forças de segurança equatorianas ou colombianas.
Tráfico transfronteiriço desenfreado
Uma reportagem da rede de televisão equatoriana Ecuavisa, veiculada em 16 de outubro passado, revelou que pelo menos 11 organizações criminosas ligadas ao tráfico de drogas estão operando nos 586 km da fronteira compartilhada com a Colômbia. Esses grupos expandiram sua presença e influência desde 2020, gerando um aumento das atividades ilegais em toda a região.
Entre os grupos colombianos mais conhecidos identificados pela reportagem estão o Exército de Libertação Nacional (ELN), o Clã do Golfo (Clan del Golfo) e facções dissidentes das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC).
Do lado equatoriano, os grupos criminais que detêm um “controle significativo” ao longo da fronteira incluem Los Choneros, Águilas, Patones, Tiguerones, Gánsters e Lobos.
Estas organizações estão envolvidas em uma vasta gama de atividades ilícitas, incluindo o tráfico de cocaína e armas, mineração ilegal, extorsão, assassinatos sob encomenda e lavagem de dinheiro, informou a Ecuavisa.
Os habitantes indígenas representam aproximadamente 7,7% (cerca de 1,3 milhão) da população do Equador, segundo o último censo. Estas comunidades se concentram principalmente na região da Sierra (68,2%), seguida da Amazônia (24,1%) e da Costa (7,6%).
Pobreza,oportunidades econômicas escassas e a crescente pressão dos grupos armados tornaram as populações indígenas — particularmente crianças e adolescentes — cada vez mais vulneráveis ao recrutamento forçado.
Violência crescente
Segundo organizações sociais, os grupos criminosos oferecem dinheiro a adultos e menores para que se juntem a eles. Aqueles que se recusam são frequentemente ameaçados de morte.
Além de semearem o medo, estes grupos armados estão provocando deslocamentos forçados e destruindo o tecido social e cultural das comunidades indígenas ao longo da fronteira Equador-Colômbia.
No Segundo Encontro Nacional de Guardiões Indígenas do Equador, nos dias 4 e 5 de outubro na comunidade ancestral de San Isidro de Pujilí, os líderes alertaram para o fato de que suas comunidades enfrentam “risco permanente e crescente” devido à escalada da violência. Eles citaram disputas territoriais, sequestros e ataques à integridade física, cultural e sexual como ameaças constantes às suas famílias e comunidades.
Os participantes destacaram o perigo crescente representado pelo crime organizado e pelos grupos armados, em especial nas regiões fronteiriças, onde o recrutamento forçado de jovens equatorianos, a intimidação e as ameaças relacionadas às drogas se tornaram cada vez mais comuns.
Do outro lado da fronteira, a Organização Nacional Indígena da Colômbia (ONIC) emitiu um alerta sobre o que descreveu como uma situação “crítica e alarmante” na Reserva Ñambí Piedra Verde e em outros territórios Awá no município de Barbacoas, em Nariño.
Em 22 de março, desconhecidos incendiaram a casa de Aurelio Araujo Hernández, recém nomeado coordenador-geral da organização Cabildo Mayor Awá de Ricaurte (Camawari).
A ONIC condenou o ataque como um claro ato de intimidação, parte de um padrão mais amplo de ameaças, deslocamentos forçados e violência contra as comunidades indígenas da região.