Ambiente
Exploração de petróleo provoca protestos de indígenas no Equador
Há um ano, 59% dos eleitores equatorianos votaram para deixar o petróleo bruto intocado no Parque Nacional Yasuní, uma reserva da biosfera que abriga comunidades indígenas. Mas 246 dos 247 poços em um bloco ainda estão em operação.

Por AFP |
GUIYERO, Equador – Uma espessa camada de petróleo cobre parte de um estuário na Amazônia equatoriana, onde o povo indígena Waorani implora às autoridades que parem de explorar o ouro negro que continua sendo derramado em seu meio ambiente.
A lama preta também cobre a vegetação ao longo de uma estrada que leva à aldeia de Guiyero, no Parque Nacional Yasuní, um dos biomas mais diversos do mundo.
"É hora de dizer basta! Eles abusaram de nós", protestou à AFP Ene Nenquimo, vice-presidente da organização Nacionalidade Waorani (Nawe), usando um cocar de penas multicoloridas.
Segundo ambientalistas, o derramamento de óleo mais recente, entre muitos na reserva, ocorreu em junho.
![Indígena Waorani visita poço de petróleo abandonado perto de Guiyero, aldeia Waorani, no Parque Nacional Yasuní, província de Orellana, Equador. [Rodrigo Buendía/AFP]](/gc4/images/2024/09/11/47527-ecuador1-600_384.webp)
![Indígenas Waorani visitam poço de petróleo abandonado perto de Guiyero, aldeia Waorani, no Parque Nacional Yasuní, província de Orellana, Equador. [Rodrigo Buendía/AFP]](/gc4/images/2024/09/11/47529-ecuador3-600_384.webp)
A petrolífera estatal Petroecuador admitiu que uma quantidade indeterminada de petróleo vazou de um de seus blocos para o meio ambiente, contaminando fontes de água em vários municípios e atingindo o rio Napo, afluente do Amazonas.
“Grandes lagartos morreram”, lamentou Pablo Ahua, 44 anos, um dos quase 100 indígenas residentes de Guiyero, que fica perto de um dos poços de petróleo da reserva.
Prazo de referendo termina
O Parque Nacional Yasuní ganhou destaque internacional no ano passado, depois que os equatorianos votaram pela suspensão das perfurações num bloco da reserva, uma medida que foi considerada um exemplo histórico de democracia climática.
A reserva se estende por mais de 1 milhão de hectares e abriga pelo menos três das últimas populações indígenas isoladas do mundo e uma abundância de espécies vegetais e animais.
O referendo exigiu que o governo parasse de extrair do Bloco 43 até agosto – no entanto, apenas um dos seus 247 poços foi fechado.
O governo estima que serão necessários pelo menos cinco anos para cortar toda a exploração do bloco, que produz 50.000 barris por dia, cerca de 10% da produção total do país.
Ene Nenquimo apontou que o estado equatoriano “deve respeitar” o referendo, “goste ou não”.
Alguns moradores locais, assim como o líder indígena, querem interromper toda a extração de petróleo na reserva e em outras partes da Amazônia equatoriana.
Os derrames de petróleo provocam “um impacto imenso que ninguém pode remediar”, alertou Nenquimo.
“Eles dizem que é para o desenvolvimento das comunidades, [mas] não há desenvolvimento. Tudo o que o petróleo deixa são danos ambientais.”
'Fomos esquecidos'
No entanto, outros apoiam as empresas petrolíferas e os benefícios que o crescimento econômico trouxe às suas aldeias.
Em 2023, o Equador estimou perdas de US$ 16,47 bilhões ao longo de duas décadas se fechasse o Bloco 43 – um dos 80 na parte da Amazônia pertencente ao país.
A exploração do petróleo tem sido um dos pilares da economia equatoriana desde a década de 1970.
O petróleo bruto, principal produto de exportação do país, gerou receitas de US$ 7,8 bilhões em 2023.
As comunidades indígenas são as mais afetadas pela pobreza no Equador, que atingia 25,5% das pessoas em junho. Já a pobreza extrema afeta mais de 10% da população de 17 milhões de habitantes do país.
“Nós [indígenas] não temos ninguém cuidando da gente; fomos esquecidos” e carecemos de serviços essenciais como saúde, reclamou Ene Nenquimo.
A tribo Waorani é composta por cerca de 4.000 membros que possuem cerca de 800.000 hectares na Amazônia, embora reivindiquem mais 1,2 milhão de hectares.
No Equador, a constituição reconhece a “propriedade coletiva da terra dos povos indígenas como uma forma ancestral de organização territorial”.
O estado, no entanto, mantém o controle sobre tudo o que está sob o solo.
'Altas taxas de câncer'
Kevin Koenig, da ONG Amazon Watch, destacou outro perigo para os residentes de Yasuní: as ligações entre aqueles que vivem perto de poços de petróleo e “altas taxas de câncer”.
Ele apela para que os países desenvolvidos financiem a proteção ambiental com alternativas como a troca de dívidas.
O Parque Nacional Yasuní abriga cerca de 2.000 espécies de árvores, 610 de pássaros, 204 de mamíferos, 150 de anfíbios e mais de 120 de répteis, segundo a Universidade São Francisco de Quito.
Em Guiyero, um grupo de indígenas, nus e portando lanças, canta em sua língua, "wao terero".
“Eles estão dizendo: nos ajudem a defender nosso território”, traduz Freddy Nihua, líder do Wao de Orellana, uma das duas províncias de Yasuní.