Diplomacia
Influência da China no Equador: benefício ou fardo?
Em geral, Equador tem uma visão favorável da China e de sua robusta economia - apesar da corrupção das empresas chinesas, das preocupações ambientais, da qualidade questionável dos projetos e da exploração de mão de obra.
![Grupo de mulheres grita palavras de ordem em protesto contra a assinatura de um contrato entre o governo equatoriano e uma empresa chinesa para a exploração de cobre na Floresta Amazônica, em março de 2012, em frente à embaixada da China em Quito. [Rodrigo Buendia/AFP]](/gc4/images/2024/10/29/47838-ecuador11-600_384.webp)
Por Catalino Hoyos |
QUITO - Meio século depois, a sabedoria da abertura do Equador à China parece cada vez mais duvidosa.
A compra de 20.000 toneladas de bananas marcou o início das relações comerciais e políticas entre a China e o Equador, antes mesmo do estabelecimento de relações diplomáticas formais.
Era 1973, um ano após Quito ter cumprido a condição prévia de Pequim para esses acordos: o rompimento de laços com Taiwan.
Grandes negócios foram fechados, mas só em 1980 a China abriu sua embaixada em Quito. O Equador retribuiu com a abertura da sua embaixada em Pequim.
![Durante sessão plenária da Assembleia Nacional do Equador, ativistas da sociedade civil seguram cartazes contra acordo de livre comércio com a China. [Equador Hoje].](/gc4/images/2024/10/29/47144-ecuador1-600_384.webp)
Assim começou uma relação que resultou na assinatura de 267 acordos internacionais até ao ano passado, 54% dos quais estabelecidos durante a presidência socialista de Rafael Correa (2007-2017).
No entanto, os laços sino-equatorianos geram preocupações entre analistas e ativistas, que temem que Pequim possa buscar vantagens adicionais ou desrespeitar as leis nacionais, particularmente as relacionadas ao meio ambiente e ao trabalho.
Diana Castro, pesquisadora de estudos latino-americanos do projeto América Latina Sustentável, atribui o aprofundamento das relações a vários acontecimentos importantes ocorridos no Equador durante a década de Correa.
Entre estes eventos estão o boom dos preços das commodities, uma disputa com o Banco Mundial, a declaração de moratória da dívida e um aumento significativo das despesas públicas para financiar um projeto destinado a transformar a matriz energética.
Déficit comercial
Em 2015, Correa e o presidente da China, Xi Jinping, consolidaram sua cooperação.
Em 2016, as duas partes elevaram suas relações a uma Aliança Estratégica Abrangente, posicionando o Equador como um aliado fundamental da China na região.
Esse movimento coincidiu também com o reforço da presença da China nos países da América Latina.
Após o fim da era “correísta”, em 2017, o então presidente Lenín Moreno, que inicialmente pretendia dar continuidade ao modelo de esquerda, mudou de direção e adotou várias posições contrárias às políticas de Correa, inclusive na esfera econômica.
Mas ele manteve laços estreitos com a China e até expandiu a cooperação para novas áreas.
Essa situação ocorreu porque o Equador manteve seu padrão primário de exportação: vender matérias-primas e produtos agrícolas para a China e importar bens manufaturados e equipamentos essenciais, explica Castro.
Sob essa dinâmica, Quito manteve um déficit comercial com Pequim.
De 2017 a 2022, as exportações equatorianas para o país asiático cresceram a uma taxa de 99,4% ao ano, de acordo com o portal de estatísticas OEC.
Em 2000, a China era o 12º maior comprador de produtos equatorianos. Em 2022, ultrapassou os Estados Unidos para se tornar o principal cliente.
Em 2023, o Equador até registrou um pequeno superávit comercial com a China.
As maiores compras chinesas provenientes do país sul-americano são nos setores de mineração e petróleo, mas a nação asiática também importa quantidades significativas de camarão, madeira, banana e peixe.
As principais importações do Equador provenientes da China incluem maquinário, aparelhos mecânicos e elétricos, veículos e produtos manufaturados.
Danos ambientais
Em 2022, ocorreu um fato crucial para o reforço das relações: o presidente Guillermo Lasso, mantendo a posição positiva de Correa em relação à China, anunciou um Acordo de Livre Comércio (ALC).
O pacto colocou o Equador na lista de países latino-americanos com ALC com a China, ao lado de Chile, Costa Rica e Peru. Posteriormente, a Nicarágua também assinou seu tratado.
As negociações do acordo de livre comércio ocorreram sem a participação da sociedade civil e não incluíram questões fundamentais sobre o meio ambiente e o trabalho, diz Castro.
Essa abordagem está em sintonia com os interesses chineses, uma vez que Pequim é frequentemente denunciada em outros países pelas suas práticas ambientais e pela incapacidade de proteger os direitos dos trabalhadores.
Os ambientalistas estão preocupados com a possibilidade de importação de resíduos tóxicos, com as ameaças aos direitos ambientais dos povos indígenas, desmatamento e o risco de o ALC prejudicar a soberania alimentar do país.
Eles também temem que isso possa levar a importações sem restrições de sementes geneticamente modificadas e a exportações excessivas.
As empresas chinesas que operam no exterior “enfrentam supervisão pública mínima”, alertou em fevereiro o think tank Diálogo Político, de Montevidéu, no Uruguai.
“Sem a ameaça de consequências sociais, econômicas ou jurídicas para suas ações, esses investidores não têm o incentivo para adotar práticas responsáveis que atenuem o impacto de seus projetos”, disse a instituição.
"Armadilha da dívida"
Ao longo dos anos, a China tornou-se também o principal credor do Equador.
Em 2022, Quito chegou a um acordo de reestruturação da dívida com Pequim, mas ainda deve à China quase US$ 5 bilhões, de acordo com o think tank Wilson Center, de Washington, DC.
A forte presença econômica chinesa no Equador é evidente em duas áreas principais: investimento direto através de empresas chinesas e participação em várias concessões.
No entanto, há grandes preocupações quanto às potenciais implicações do comportamento chinês nesses segmentos.
“Os investimentos chineses no Equador têm-se concentrado em três setores que não contribuem para promover uma transição energética sustentável e equitativa”, adverte Castro.
Esses setores incluem a construção e o financiamento de infraestruturas públicas, petróleo e mineração.
Ao longo dos anos, o Equador assistiu a várias mudanças no seu governo, com as consequentes alterações ideológicas.
Independentemente dessas mudanças, o país tende a ver a China e sua poderosa economia com bons olhos, apesar dos casos de corrupção que envolvem empresas chinesas em território equatoriano.
Os ativistas, em particular os ambientalistas, pedem políticas para evitar danos irreversíveis por parte das empresas chinesas.