Economia
Projeto de barragem da China em Honduras: bênção ou maldição?
Detalhes de projeto de obra concedido à China Civil Engineering Construction Corporation (CCECC) são obscuros, levantando preocupações sobre potenciais custos inflacionados, condições desfavoráveis e corrupção.
![A presidente de Honduras, Xiomara Castro (à direita), e o presidente da China, Xi Jinping (à esquerda), examinam a guarda de honra chinesa durante uma cerimônia de boas-vindas em Pequim, em junho de 2023. [Wang Zhao/AFP]](/gc4/images/2024/12/17/48530-honduras2-600_384.webp)
Por Daniela Hernández |
TEGUCIGALPA – O projeto da barragem Río del Hombre, concedido à China Civil Engineering Construction Corporation (CCECC), gerou grande polêmica em Honduras devido a preocupações com a transparência e o histórico internacional da empresa.
Situado na microbacia do Río del Hombre, no Vale da Amarateca, no departamento de Francisco Morazán, o projeto pretende transferir água para Tegucigalpa através de uma linha de produção de 21,1 km de extensão. Observadores estimam que a obra não será concluída antes de 2029.
O reservatório deverá ter capacidade de armazenamento de 90 a 104 hectômetros cúbicos e vazão projetada de 2,12 metros cúbicos por segundo.
O prefeito de Tegucigalpa, Jorge Aldana, e o representante da CCECC, Guan Jaxin, assinaram em 12 de setembro uma carta de intenções para a realização de estudos de viabilidade para o novo reservatório.
![O prefeito de Tegucigalpa, Jorge Aldana (canto inferior direito), e o representante da China Civil Engineering Construction Corporation (CCECC) Guan Jaxin (canto inferior esquerdo) são fotografados em 12 de setembro durante a assinatura de uma carta de intenções para o projeto da barragem Rìo del Hombre, que visa transferir água para Tegucigalpa. [Prefeitura de Tegucigalpa]](/gc4/images/2024/12/17/48529-honduras1-600_384.webp)
"Estamos trabalhando nesses acordos há um ano. Hoje foi alcançada a assinatura que nos permitirá avançar na conclusão dos estudos, no projeto e na construção da barragem", disse Aldana na cerimônia de assinatura.
Falta de transparência
O custo do projeto, estimado entre US$ 500 milhões e US$ 550 milhões, permanece envolto em incertezas, uma vez que o mecanismo de financiamento e os termos do acordo não foram divulgados.
O marco legal do projeto faz parte de um decreto emergencial que permite a contratação sem fiscalização do Congresso Nacional, nos termos da Lei de Contratações Estaduais.
Essa falta de transparência motivou críticas de vários setores, especialmente porque a carta de intenções assinada em setembro permanece sob sigilo.
Figuras importantes, como a conselheira do Distrito Central, Lidieth Díaz, que representa os cidadãos perante as autoridades locais, e o vice-presidente do Congresso, Hugo Noé Pino, disseram desconhecer os detalhes do projeto.
Enquanto isso, analistas e veículos de comunicação associam o caso a um padrão de polêmicas, corrupção e sanções envolvendo a CCECC.
A empresa é alvo de acusações de suborno, corrupção, lavagem de dinheiro e falsificação de documentos em países como Nigéria, Equador e Peru.
O governo peruano sancionou a empresa até julho de 2026 devido a irregularidades contratuais, violações trabalhistas e questões de segurança.
No Equador, usuários relataram defeitos estruturais nas estradas construídas pela CCECC logo após a inauguração das obras.
Além disso, os projetos foram marcados por custos inflacionados e termos contratuais desfavoráveis aos países contratantes.
Na Nigéria, as queixas incluem condições de trabalho desumanas e acidentes frequentes causados pela falta de medidas de segurança.
Perda de credibilidade
Esses problemas geraram grandes preocupações em Honduras, especialmente no que diz respeito aos riscos financeiros associados à represa Río del Hombre.
Uma análise da ONG Expediente Público publicada no final de novembro alertou que a experiência de outros países indica um elevado risco de excesso de custos e cláusulas contratuais desfavoráveis potencialmente prejudiciais para Honduras.
O relatório destacou que o acesso limitado à informação e a falta de transparência nos acordos dificultam a supervisão pública e aumentam a probabilidade de irregularidades, com potenciais “impactos à reputação”.
A parceria com uma empresa marcada por escândalos de corrupção e sanções poderia comprometer a credibilidade do projeto e da administração municipal de Tegucigalpa, de acordo com o documento.
Os interesses da população hondurenha estão em jogo, alertou o relatório.
Embora a barragem do Rio del Hombre seja fundamental para resolver a escassez crônica de água em Tegucigalpa, a ONG enumera sérias preocupações com relação à execução da obra devido ao histórico questionável da CCECC.
O sigilo no processo de contratação e os riscos associados à CCECC evidenciam a necessidade de uma supervisão mais rigorosa e de divulgação completa dos detalhes do acordo, destacou o relatório.
Encargos financeiros, dependência
Honduras estabeleceu relações diplomáticas com a China em março de 2023, rompendo a sua relação de longa data com Taiwan.
Essa decisão pôs fim a décadas de cooperação ao longo das quais Taiwan forneceu ajuda econômica significativa, doações e apoio técnico a Honduras, especialmente na saúde e na educação.
A República Popular da China, que vê Taiwan como uma província separatista apesar de nunca a ter governado, proíbe relações diplomáticas com qualquer país que reconheça Taiwan.
Após essa mudança, Honduras tem explorado formas de aprofundar seus laços com a China, focando principalmente em cooperação nas áreas de energia e infraestrutura..
A mudança marca um momento crítico na política externa de Honduras. Embora a parceria com a China possa oferecer potenciais benefícios econômicos, também apresenta riscos geopolíticos e sociais significativos.
Analistas advertem sobre os potenciais custos e dependências que podem surgir caso Honduras tenha dificuldades para pagar os empréstimos, o que pode levar ao confisco de ativos estratégicos ou à aceitação de condições desfavoráveis.
Investimentos chineses na América Latina têm sido frequentemente associados a corrupção, degradação ambiental e violações dos direitos indígenas.
Honduras poderá enfrentar desafios semelhantes à medida que buscar projetos de infraestrutura liderados por empresas estatais chinesas, alertaram analistas.