Economia

Estatal chinesa com passado corrupto constrói Estádio Nacional de El Salvador

Enquanto construção do Estádio Nacional em San Salvador avança, críticos dizem que acordos de El Salvador com China estão cercados de segredo e excluem trabalhadores locais.

Construção do Estádio Nacional de El Salvador avança a um ritmo lento, com pouca transparência por parte da estatal chinesa que lidera o projeto, a China State Construction Engineering Corporation. Uma bandeira chinesa é visível no canteiro de obras, destacando o envolvimento de Pequim. [Gaby Chávez]
Construção do Estádio Nacional de El Salvador avança a um ritmo lento, com pouca transparência por parte da estatal chinesa que lidera o projeto, a China State Construction Engineering Corporation. Uma bandeira chinesa é visível no canteiro de obras, destacando o envolvimento de Pequim. [Gaby Chávez]

Por Gaby Chávez |

SAN SALVADOR – A construção do novo Estádio Nacional de El Salvador — anunciado como um projeto emblemático de infraestrutura financiado pela China — gerou alarme entre os defensores da transparência devido ao histórico da empresa estatal chinesa encarregada da obra.

A China State Construction Engineering Corporation (CSCEC), uma das maiores empresas de construção do mundo, enfrentou alegações de corrupção, investigações de fraude e outras acusações de má conduta em vários países, incluindo a Bolívia.

Seu histórico levou à inclusão em listas negras e sanções por parte de instituições globais, como o Banco Mundial.

Análise do acordo

Mesmo após essas instituições sancionarem a CSCEC por suposto suborno, conluio, práticas fraudulentas, exploração trabalhista e danos ambientais, Pequim a escolheu para liderar a construção do Estádio Nacional de El Salvador — parte de uma doação do governo chinês.

Grafite de protesto ao lado de uma imagem promocional do Estádio Nacional de El Salvador ressalta a crescente frustração local com o projeto liderado pela China, administrado pela estatal China State Construction Engineering Corporation. [Gaby Chávez]
Grafite de protesto ao lado de uma imagem promocional do Estádio Nacional de El Salvador ressalta a crescente frustração local com o projeto liderado pela China, administrado pela estatal China State Construction Engineering Corporation. [Gaby Chávez]
Imagem gerada por computação gráfica do Estádio Nacional de El Salvador, promovido pelo governo salvadorenho como "o estádio mais moderno da América Latina e o maior da América Central". A China State Construction Engineering Corporation está construindo a arena como parte de um acordo de cooperação sino-salvadorenho. [Gabinete presidencial de El Salvador]
Imagem gerada por computação gráfica do Estádio Nacional de El Salvador, promovido pelo governo salvadorenho como "o estádio mais moderno da América Latina e o maior da América Central". A China State Construction Engineering Corporation está construindo a arena como parte de um acordo de cooperação sino-salvadorenho. [Gabinete presidencial de El Salvador]

O governo salvadorenho anunciou em dezembro de 2021, pelas redes sociais, que a construção começaria em 2022. Mas foi somente no final de 2023 que o embaixador da China em El Salvador, Zhang Yanhu, confirmou o início da obra, com um orçamento estimado em quase US$ 100 milhões.

Trabalhadores estão construindo o estádio no antigo local de uma academia militar, e a supervisão do projeto cabe ao Instituto Nacional dos Esportes de El Salvador (INDES).

No entanto, o processo atraiu críticas generalizadas por sua falta de transparência. No final de 2024, representantes do INDES afirmaram que não tinham acesso a informações contratuais ou orçamentárias, já que autoridades chinesas estavam gerenciando o projeto sozinhas.

Em seu relatório de transparência em maio passado, o diretor executivo da Acción Ciudadana (Ação Cidadã), Eduardo Escobar, qualificou o acordo como uma violação do direito de acesso a informações públicas, alertando que a falta de supervisão local corrói a transparência e a responsabilidade no uso de recursos públicos.

"O governo salvadorenho não pode se desvincular de um projeto que está sendo construído em território nacional", disse Escobar, enfatizando a obrigação do Estado com seus cidadãos.

'O pior negócio'

Projetos salvadorenhos vinculados à China estão sendo tratados com "grande sigilo", disse o analista político Napoleón Campos em 22 de abril ao jornal salvadorenho El Diario de Hoy.

"Embora o estádio esteja em construção, está claro que as relações diplomáticas com a China têm sido marcadas pela obscuridade desde a compra de vacinas chinesas durante a pandemia [de COVID-19]", disse Campos, referindo-se aos acordos confidenciais assinados em 2020 para a aquisição de vacinas.

Líderes empresariais salvadorenhos expressaram preocupação com os termos do acordo com a China, que, segundo eles, dão às empresas chinesas amplos poderes na concepção e contratação de projetos — potencialmente marginalizando a mão de obra e as empresas nacionais.

"É o pior negócio para El Salvador", disse Federico Hernández, diretor executivo da Câmara de Comércio, em entrevista à revista Summa em maio de 2021, após a Assembleia Legislativa ratificar naquele mês um acordo com a China, que incluía a construção do estádio, uma estação de tratamento de água e uma biblioteca nacional.

"É uma lástima, por exemplo, que os trabalhadores salvadorenhos não tenham oportunidades de emprego nas obras que estão sendo realizadas", acrescentou.

Leonor Selva, diretora executiva da Associação Nacional da Empresa Privada (ANEP), ecoou essas preocupações na mesma reportagem, argumentando que acordos de infraestrutura com empresas chinesas normalmente excluem mão de obra e materiais salvadorenhos, limitando qualquer impacto real na economia local.

Sindicatos salvadorenhos denunciaram os acordos, alegando que eles excluem completamente as empreiteiras locais e não geram empregos para os salvadorenhos. Os críticos alegam ainda um padrão duplo: enquanto as empresas chinesas desfrutam de total autonomia com relação a concepção, execução e cronogramas dos projetos, as empresas salvadorenhas devem cumprir longos processos de aprovação.

Em março, o presidente do INDES, Yamil Bukele — irmão do presidente salvadorenho, Nayib Bukele —, apresentou uma maquete do novo estádio junto com Zhang, o embaixador chinês.

A inauguração do estádio está prevista para meados de 2027, com capacidade para 50.000 pessoas.

Violações na Bolívia

A CSCEC, estatal que está construindo o estádio, tem um longo histórico mundial de alegações de má conduta.

Entre 2009 e 2015, o Banco Mundial incluiu a empresa em uma lista negra por práticas fraudulentas durante processos de licitação, tornando-a inelegível para contratos financiados pela instituição.

Em uma investigação divulgada em maio passado pelo Business & Human Rights Resource Center, o Banco Mundial delineou uma padrão de abusos ligados a um projeto rodoviário de US$ 230 milhões na Bolívia concedido à CSCEC pela Administração Rodoviária Boliviana (ABC).

Em 2018, o Banco Mundial financiou a construção de um corredor de 200 km de extensão — destinado a atender cerca de 125.000 moradores, dos quais mais da metade são indígenas.

As consultas consistiram apenas em reuniões breves com pouca oportunidade para um diálogo genuíno, disseram líderes indígenas aos investigadores.

A CSCEC coagiu moradores a assinar acordos de concessão de terras desfavoráveis ​​para a extração de materiais de construção, muitas vezes a preços abaixo do valor de mercado, segundo eles.

As moradias que os chineses prometeram em troca estavam supostamente incompletas e eram inadequadas para o clima local.

O Banco Mundial acusou a empresa de poluir fontes essenciais de água, de não cumprir a legislação trabalhista e não fornecer proteções básicas aos trabalhadores, como pagamento em dia e cobertura de saúde.

Nem a CSCEC nem as autoridades bolivianas responderam publicamente às alegações.

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