Economia
Projetos de infraestrutura da China espalham suspeitas de corrupção na Colômbia
A chamada Nova Rota da Seda representa uma 'forma moderna de colonialismo' disfarçada, dizem analistas.
![Presidente chinês, Xi Jinping (centro), durante cerimônia de assinatura entre Colômbia e China em Pequim, em outubro de 2023. [Ken Ishii/AFP]](/gc4/images/2024/12/04/48383-colombia1-600_384.webp)
Por Andrés Pachón |
BOGOTÁ – O investimento da China e o desenvolvimento de projetos de infraestrutura na América Latina e na Colômbia representam uma ameaça significativa em termos de corrupção e repercussões econômicas invisíveis, segundo especialistas.
Os projetos de infraestrutura liderados por empresas estatais chinesas têm o objetivo de manter a influência global de Pequim, mesmo às custas de perturbações regionais, alerta Francisco Santos, ex-vice-presidente da Colômbia e ex-embaixador colombiano em Washington, em entrevista ao Entorno.
Um exemplo é o projeto do Metrô de Bogotá, atualmente em construção por um consórcio chinês.
Em 16 de outubro de 2019, Bogotá assinou o contrato para a construção da primeira seção do metrô elevado da cidade com a China Harbour Engineering Company (CHEC) e a Xi'an Metro Company, ambas de propriedade de Pequim.
![Delegação da Companhia de Metrô de Bogotá visitou, em meados de novembro, a cidade chinesa de Changchun, sede da China Rail Rolling Stock Corp, fabricante dos trens da Linha 1 do Metrô de Bogotá. [Companhia de Metrô de Bogotá].](/gc4/images/2024/12/04/48384-colombia22-600_384.webp)
![Construção da autoestrada ao Mar 2, que ligará Medellín a Urabá, em Antioquia, a cargo da empresa chinesa CHEC. [Ministério dos Transportes da Colômbia].](/gc4/images/2024/12/04/48385-colombia33-600_384.webp)
O consórcio ganhou a licitação ao apresentar uma proposta inferior à de dois concorrentes.
A oferta foi de 13,8 bilhões de pesos colombianos (aproximadamente US$ 3,1 bilhões).
O projeto do Metrô de Bogotá tem extensão de 23,9 km e estava inicialmente previsto para começar em 2020. Mas a construção só teve início em agosto de 2021, tendo sido afetada por vários atrasos e alegações de corrupção durante o processo de concessão do contrato.
Bogotá, com quase 8 milhões de habitantes, continua a ser uma das poucas capitais latino-americanas sem sistema de metrô.
A primeira fase é projetada para transportar 72.000 passageiros por hora, utilizando 20 trens.
Apesar do apoio financeiro do Banco Interamericano de Desenvolvimento, do Banco Mundial e do Banco Europeu de Investimento, persistem preocupações quanto à falta de experiência da CHEC e da Xi'an Metro na construção de linhas metroviárias.
Segurança de dados preocupa
Os riscos vão além dos atrasos na construção, explica Santos. A China irá operar o sistema de metrô por 25 anos após a conclusão de sua primeira fase, prevista para o início de 2028.
Esta gestão de longo prazo suscita grandes preocupações em relação aos dados dos usuários.
“Todos os dados dos utilizadores do Metrô de Bogotá serão digitalizados, com o apoio de sistemas de reconhecimento facial”, explicou Santos. “Embora esta informação vá ser supostamente gerida pelo governo colombiano, o verdadeiro beneficiário será, sem dúvida, a China, enquanto operadora do sistema.”
Santos chama ainda a atenção para o histórico da China no aproveitamento de dados.
“Os chineses garantem sempre a existência de uma porta dos fundos que lhes dá acesso a estas informações. Eles as utilizam não apenas em aplicações militares, mas também no avanço da inteligência artificial e em outros empreendimentos mais questionáveis”, ressaltou.
Estas práticas estão estreitamente ligadas à “Iniciativa do Cinturão e Rota” (ICR) da China, lançada em 2013, disse ele.
Também conhecida como a Nova Rota da Seda, a ICR é uma estratégia de investimento multibilionária que visa expandir o alcance do comércio global da China através da construção de infraestruturas de transporte, incluindo projetos-chave na América Latina.
Até o momento, mais de 100 países aderiram à iniciativa. A Colômbia pode seguir o exemplo em breve, pois Bogotá e Pequim criaram recentemente um grupo de trabalho para explorar a possível participação da nação na ICR.
“Formamos um grupo de trabalho conjunto para criar consenso e, dentro de um prazo razoável, explorar a potencial adesão da Colômbia à ICR”, anunciou o ministro colombiano das Relações Exteriores, Luis Gilberto Murillo, em Pequim, em 10 de outubro.
Práticas negligentes
A Colômbia se tornou um pólo de atração para grandes projetos de infraestrutura liderados por empresas estatais chinesas.
Entre eles, está o Regiotram de Occidente, um sistema ferroviário leve concebido para ligar Bogotá aos municípios vizinhos, que está em construção pela China Civil Engineering Construction Corporation (CCECC).
A CCECC está sendo investigada por suborno, lavagem de dinheiro e outras alegadas irregularidades no Peru, Nigéria, Geórgia e pelo menos outros sete países.
Outra iniciativa importante é a Autopista al Mar 2, uma autoestrada com 254 km de extensão, destinada a ligar Medellín ao Golfo de Urabá, em Antioquia.
A CHEC, empresa que lidera a construção deste projeto e do metrô de Bogotá, foi acusada de corrupção, má gestão, uso de materiais de baixa qualidade e irregularidades em zonas protegidas.
Estas questões surgiram na Bolívia, Costa Rica, Honduras, Jamaica e em vários outros países onde a empresa participa em grandes projetos de infraestrutura.
Nos últimos anos, a China conseguiu contratos para grandes projetos de infraestrutura na Colômbia, apresentando propostas substancialmente inferiores às dos concorrentes - uma estratégia mais tarde compensada por custos excessivos ou acordos operacionais de longo prazo, como no caso do metrô de Bogotá.
Juana Afanador, socióloga e líder da comissão de acompanhamento do projeto do metrô, classificou como “prejudicial e arriscada” a aceitação pela Colômbia de propostas chinesas impossivelmente baixas.
“O resultado é que os custos excessivos durante a construção acabam por compensar a proposta inicial baixa”, disse ela.
Em declarações ao Entorno, Afanador apontou irregularidades no processo de licitação do primeiro trecho do metrô, alegando conluio em favor da CHEC.
“No momento em que o contrato foi concedido à CHEC, os outros dois concorrentes já tinham retirado suas propostas, o que suscita sérias preocupações em termos de transparência”, argumentou.
Afanador salienta também os desafios para promover um debate informado sobre o projeto do metrô, devido aos interesses políticos que o envolvem.
“O histórico jurídico da CHEC em outros países – marcado por excessos de custos e subornos – é profundamente preocupante e revela uma empresa indigna de confiança”, disse Afanador.
A capacidade da CHEC para continuar ganhando licitações fraudulentas “representa uma forma moderna de colonialismo disfarçada de Nova Rota da Seda”, disse ela.