Economia

Honduras e o ‘lado obscuro’ associado aos tratados de livre comércio com a China

Experiências de outros países latino-americanos que assinaram TLCs com Pequim deixam claro que só existe um vencedor: a China. À medida que as negociações avançam, as preocupações em Honduras aumentam.

Presidente hondurenha, Xiomara Castro, e o líder chinês, Xi Jinping, inspecionam guardas de honra chineses durante cerimônia de boas-vindas em Pequim, em 12 de junho de 2023. [Wang Zhao/AFP]
Presidente hondurenha, Xiomara Castro, e o líder chinês, Xi Jinping, inspecionam guardas de honra chineses durante cerimônia de boas-vindas em Pequim, em 12 de junho de 2023. [Wang Zhao/AFP]

Por Francisco Hernández |

TEGUCIGALPA -- Um Tratado de Livre Comércio (TLC) em negociação entre Honduras e China levantou preocupações significativas sobre seu potencial impacto negativo para as empresas locais, um padrão que já foi observado em outros países da América Central, segundo analistas e representantes de associações econômicas.

A sexta rodada de negociações do TLC entre Honduras e China ocorreu em Pequim, de 29 a 31 de julho.

A data da sétima rodada ainda não foi definida, mas espera-se que ocorra em Tegucigalpa antes do final de 2024.

Em resposta às preocupações levantadas sobre o potencial impacto negativo de um TLC com a China, o ministro do Desenvolvimento Econômico, Fredis Cerrato, afirmou no fim de agosto que o governo não aprovará quaisquer acordos que possam prejudicar setores-chave da economia hondurenha.

Grafite em Tegucigalpa onde se lê “Honduras com Taiwan”. [Orlando Sierra/AFP]
Grafite em Tegucigalpa onde se lê “Honduras com Taiwan”. [Orlando Sierra/AFP]
Mural em Tegucigalpa faz alusão a Taiwan, em março de 2023. [AFP]
Mural em Tegucigalpa faz alusão a Taiwan, em março de 2023. [AFP]

“Não negociaremos nada que possa nos prejudicar em setores onde possa ocorrer perda de empregos, como vimos acontecer com alguns tratados anteriores”, garantiu ele.

Acabando com os negócios

O potencial TLC suscitou críticas de muitos setores da sociedade hondurenha.

Salvador Nasralla, ex-vice-presidente e candidato às eleições presidenciais de 2025, tem criticado veementemente as negociações com a China e a decisão do governo Xiomara Castro de cortar laços com Taiwan em favor do estabelecimento de relações diplomáticas com Pequim em março de 2023.

“Honduras não pode assinar um tratado de livre comércio com a China; isso precisa parar”, protestou ele.

O candidato presidencial argumentou que a economia da China é muito mais poderosa do que a de Honduras, alertando que “inundarão o nosso mercado com seus produtos, destruindo nossas pequenas empresas e deixando o povo sem oportunidade de trabalho”.

Nasralla indicou que, se eleito, restauraria as relações diplomáticas com Taiwan, um parceiro historicamente confiável para Honduras.

Armando Urtecho, diretor executivo do Conselho Hondurenho de Empresa Privada (Cohep), também alegou que “os termos propostos pela China são inaceitáveis ​​tanto para o governo como para o setor privado”.

“É crucial proteger os investimentos e os empregos em Honduras”, apontou ele em comentários publicados pelo site de notícias El Espectador de Honduras em 7 de agosto.

Ao mesmo tempo, a jornalista e analista Lourdes Chávez, num editorial publicado no La Tribuna, criticou as negociações do TLC, argumentando que a China busca apenas seus próprios interesses e está atraindo o governo hondurenho com presentes e ajuda econômica.

"Honduras pagou um preço elevado desde a colonização espanhola; agora, os chineses estão atraindo este governo com a 'miragem' de projetos comerciais e de mega-infraestruturas, prometendo uma fuga da pobreza como a dos países vizinhos", escreveu ela em seu artigo publicado em 8 de setembro.

A jornalista também afirmou que Pequim conseguiu persuadir alguns países da América Central a darem às costas a seus aliados históricos, incluindo Taiwan e os Estados Unidos.

"Eles [a China] nos atraem com 'pequenos presentes' que terão um grande custo. A Costa Rica serve de exemplo do que devemos evitar; é crucial que apelemos a nossas autoridades que reconsiderem esta relação comercial desigual com a China." Chávez escreveu.

'Lado obscuro'

Relatórios recentes da Fundação CADAL (Centro para a Abertura e Desenvolvimento da América Latina) encontraram uma conclusão clara sobre os TLC assinados pela Costa Rica, Chile e Peru com o país asiático: “em todos os três casos, a China emerge como a clara vencedora no relacionamento."

“A China alcançou seus objetivos enquanto os parceiros latino-americanos viram suas expectativas total ou parcialmente não satisfeitas”, afirma o CADAL em relatório publicado em 23 de setembro.

O TLC com a Costa Rica, assinado em 2010, teve um significado político considerável para Pequim.

"Foi a primeira peça do efeito dominó... No início de 2024, o TLC com a Nicarágua entrou em vigor, enquanto estão em andamento negociações para outros três países -- Honduras, Panamá e El Salvador", aponta a fundação CADAL, que defende uma política externa ativa focada nos direitos humanos.

As expectativas comerciais da Costa Rica não foram satisfeitas.

Doze anos após a entrada em vigor do acordo, os produtos chineses inundaram o mercado costarriquenho, levando a um aumento surpreendente de 431% nas importações.

Esta alta resultou num preocupante déficit comercial para a Costa Rica, conforme o último relatório sobre comércio externo da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), publicado em novembro de 2023.

Além disso, o TLC não conseguiu estimular investimentos chineses significativos, que permanecem em níveis mínimos.

Os analistas Sascha Hannig e Juan Pablo Cardenal do CADAL argumentam que uma relação comercial centrada exclusivamente na exportação de recursos naturais levanta questões sobre se ambas as partes se beneficiam verdadeiramente e igualmente do tratado.

Este comércio cria dependência da China porque os recursos naturais não proporcionam qualquer valor agregado.

Na América do Sul, outro país mordeu a isca chinesa.

O Equador se tornou "o último país regional a ter um TLC com a China em vigor (maio de 2024), após uma negociação acelerada que durou apenas 10 meses. A retórica de um cenário 'ganha-ganha' ofuscou a evidência do 'lado obscuro' associado com tratados de livre comércio com a China", concluíram em seu relatório.

Gostou desta matéria?


Captcha *