Crime e Justiça

Apreensão de minérios extraídos ilegalmente lança luz sobre ligações entre dissidentes das FARC e China

Coltan extraído ilegalmente flui para mercados internacionais por meio de cadeias de suprimentos obscuras, o que o torna quase impossível de rastrear. Muitas remessas acabam chegando à China, uma grande processadora global do minério.

Soldado venezuelano segura uma pepita de coltan em Cedeno, Venezuela. [Juan Barreto/AFP]
Soldado venezuelano segura uma pepita de coltan em Cedeno, Venezuela. [Juan Barreto/AFP]

Por Giselle Alzate |

BOGOTÁ – A recente apreensão de 49 toneladas de coltan em Villavicencio, na Colômbia, expõe um comércio ilegal multimilionário que prospera há décadas nas regiões da Amazônia e do Orinoco e tem ligações com empresas chinesas.

As autoridades colombianas anunciaram, em 2 de abril, que interceptaram a remessa em Villavicencio, revelando que ela era originária de operações ilegais de mineração em Guainía e Vichada — dois departamentos remotos de selva com enorme diversidade que fazem fronteira com a Venezuela.

A apreensão resultou em "seis capturados e um golpe contundente nas finanças criminosas que destroem os recursos naturais", afirmou o Ministério da Defesa.

O coltan, uma mistura de dois minerais, columbita e tantalita, é um componente essencial na tecnologia moderna.

Polícia colombiana intercepta em Villavicencio um carregamento de coltan extraído ilegalmente nas regiões de Guainía e Vichada. O minério tinha como destino a exportação para a China. [Ministério da Defesa da Colômbia]
Polícia colombiana intercepta em Villavicencio um carregamento de coltan extraído ilegalmente nas regiões de Guainía e Vichada. O minério tinha como destino a exportação para a China. [Ministério da Defesa da Colômbia]

É indispensável para a fabricação de dispositivos eletrônicos usados no dia a dia, como smartphones, microprocessadores, equipamentos médicos e até equipamentos militares.

A extração ilegal de coltan devasta florestas, polui rios e ameaça comunidades indígenas que dependem desses ecossistemas. A prática colocou em risco diversas regiões de floresta tropical na Colômbia e na Venezuela.

China: destino final

A operação expôs ligações entre dissidentes das FARC e empresas chinesas que adquiriram o mineral sem verificar sua origem.

"[A carga] seria comercializada no mercado internacional, tendo como destino final a China através do porto de Cartagena (no norte da Colômbia)", confirmou o brigadeiro-general José Roa, diretor de Carabineiros e Proteção Ambiental, em comunicado divulgado em 2 de abril.

As autoridades também confirmaram que a remessa apreendida pertencia a dissidentes das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), um grupo armado que opera ao longo da fronteira com a Venezuela.

De acordo com relatórios policiais, redes do crime organizado compram coltan na selva colombiana a um custo mínimo — cerca de US$ 7 por quilo. O minério é então transportado por rios até Villavicencio e por terra até Bogotá, onde seu valor sobe para cerca de US$ 25 por quilo antes de ser armazenado em depósitos.

De lá, o minério é transportado por caminhão até o porto caribenho de Cartagena, de onde segue para a China. Quando chega ao destino final, seu preço pode aumentar em até 200% por quilo.

A carga apreendida no início de abril em Villavicencio tinha um valor de mercado internacional estimado em US$ 1,2 milhão.

O presidente colombiano, Gustavo Petro, postou no X um elogio para a polícia, a Procuradoria-Geral da República e o Exército pela apreensão bem-sucedida da carga ilegal de coltan.

"Esta é a mineração ilegal que Iván Mordisco desenvolveu e que estamos desmantelando", disse Petro, referindo-se ao líder de uma facção dissidente das FARC que recentemente rompeu as negociações de paz com seu governo.

Cadeias de suprimentos obscuras

Os esforços para rastrear o tráfico ilegal de coltan na Colômbia estão sendo apoiados pelas Investigações de Segurança Interna dos EUA (HSI, na sigla em inglês), que trabalham para identificar outros países envolvidos na compra dessas cargas ilícitas, de acordo com o Ministério da Defesa.

Anteriormente, em 14 de março, autoridades colombianas haviam apreendido no departamento de Vichada 19 toneladas de coltan, destinadas à exportação para a China.

Um relatório de agosto de 2021 da InSight Crime destacou que o coltan extraído ilegalmente da Colômbia, na Venezuela e em países africanos como a República Democrática do Congo (RDC) é frequentemente contrabandeado por redes complexas antes de chegar à China.

Muitas vezes acompanhado de documentação falsificada, o coltan extraído ilegalmente entra nos mercados internacionais por meio de cadeias de suprimentos duvidosas.

A identificação de compradores chineses específicos continua sendo um desafio devido à natureza obscura do comércio. No entanto, relatórios indicam que pequenas instalações de processamento menos regulamentadas compram coltan bruto e o revendem através de plataformas online na China.

Esse processo torna o coltan acessível para as grandes empresas de processamento de minerais, como a China National Nonferrous Metals Import & Export Corporation (CNMC) e a Ningxia Orient Tantalum Industry.

Como essas cadeias de suprimentos são deliberadamente estruturadas para ocultar a origem dos materiais, distinguir o coltan legal do ilegal continua sendo quase impossível.

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