Diplomacia
Diplomacia do 'lobo guerreiro': abordagem agressiva da China irrita América Latina
'Estúpidos', 'fake news' e 'hipócritas' são alguns dos termos usados rotineiramente por diplomatas chineses na América Latina em suas tentativas de marcar pontos em discussões on-line.
![Cidadãos chineses no Peru agitam bandeiras durante a passagem do carro do presidente Xi Jinping pelo hotel Los Delfines, em Lima, onde ele discutiu vários temas com o presidente do Chile, Gabriel Boric, na Cúpula da APEC, em novembro passado. [Ernesto Benavides/AFP]](/gc4/images/2025/02/04/49023-zhu-600_384.webp)
Por Juan Camilo Escorcia |
BOGOTÁ – A diplomacia institucionalizada do “lobo guerreiro” da China, marcada por uma postura agressiva e de confronto, leva o embaixador chinês na Colômbia, Zhu Jingyang, a buscar constantemente o confronto online.
Zhu não está sozinho — em toda a América Latina, diplomatas chineses usam as redes sociais para desafiar jornalistas, políticos e críticos do modelo político e econômico do presidente Xi Jinping.
Em 30 de janeiro, Zhu respondeu duramente no X após um usuário o acusar de uso da plataforma para propaganda.
“As redes sociais arrogantes no Ocidente optaram por não se sujeitar às leis chinesas. Sua liberdade no X está muito, muito mais longe do que você pensa”, escreveu Zhu.
![O embaixador chinês na Colômbia, Zhu Jingyang, apresenta suas credenciais ao presidente Gustavo Petro em 4 de outubro de 2023. [Presidência da Colômbia]](/gc4/images/2025/02/04/49022-zhu-600_384.webp)
A troca de mensagens começou quando o usuário apontou a ironia do fato de um diplomata chinês usar uma plataforma proibida na China, afirmando que “o socialismo é apenas censura” e que Zhu estava usando a plataforma para disseminar propaganda.
Zhu, que assumiu o cargo de embaixador em 4 de outubro de 2023, ganhou fama de ser um dos diplomatas chineses mais combativos na América Latina.
Sua linguagem provocativa nas redes sociais, uma marca distintiva da estratégia do “lobo guerreiro” da China, leva a confrontos frequentes tanto com jornalistas locais quanto com meios de comunicação internacionais.
Em 11 de agosto, Zhu se envolveu em uma discussão acalorada com a jornalista Vicky Dávila, então diretora da revista colombiana Semana e agora candidata presidencial.
A disputa começou após Dávila refutar uma denúncia de Zhu sobre o capitalismo e o globalismo financeiro. Ela disse que apenas “três empresas americanas — Nvidia, Microsoft e Apple — valem mais do que toda a bolsa de valores na China”.
Dávila acusou o governo da China de repressão, afirmando que seus cidadãos vivem sob vigilância constante e que o país é “um dos menos livres do mundo”.
Zhu respondeu que preferia não discutir "com pessoas que carecem de informações básicas".
Censura e 'armadilha da dívida'
Recentemente, a rede de televisão alemã Deutsche Welle (DW) — uma das fontes mais imparciais do jornalismo internacional — virou alvo de Zhu.
Em 28 de janeiro, ele atacou a DW, chamando seus profissionais de “estúpidos” e “odiadores da China”, em resposta a uma reportagem sobre a censura no chatbot chinês DeepSeek.
A DW destacou a recusa da DeepSeek em responder a perguntas sobre o massacre da Praça Tiananmen em 1989 e a invasão do Tibete pela China em 1950, entre muitos outros temas proibidos na China.
"Sabemos que eles são estúpidos, mas não tão estúpidos assim. Só rindo!", disse Zhu no X.
O embaixador também atacou o Entorno.
Em 11 de janeiro, ele acusou o meio de comunicação de divulgar “fake news” após a publicação de reportagem sobre os riscos da chamada diplomacia da "armadilha da dívida" da China — estratégia na qual Pequim financia governos com históricos de corrupção, como o Equador sob Rafael Correa e a Venezuela durante duas décadas de chavismo, tornando-os dependentes de empréstimos com juros elevados e medidas coercivas da China em caso de inadimplência.
Mais de dez países — entre os quais Paquistão, Quênia, Zâmbia, Laos e Mongólia — ficaram à beira do colapso sob o peso da dívida insustentável com a China, informou a Associated Press em maio de 2023.
Zhu é alvo de críticas na Argentina e na Espanha por seus comentários polêmicos nas redes sociais.
Exército consular
A sequência de posts de Zhu no X segue uma tendência mais ampla entre os diplomatas chineses em todo o mundo — que pode ser descrita como o novo exército consular de Pequim.
Essa força diplomática, moldada sob a liderança de Xi, substituiu a diplomacia conservadora tradicional por uma abordagem muitas vezes combativa. Para observadores, a mudança alimenta a desconfiança global, especialmente entre os principais parceiros econômicos e os países vizinhos.
"A China enviou um quadro cada vez maior de diplomatas para o mundo das redes sociais para enfrentar todos os adversários com uma franqueza às vezes surpreendente", escreveu o correspondente diplomático da BBC, James Landale, em maio de 2020.
Esses enviados “lançam enxurradas de tuítes e postagens persistentes de suas embaixadas pelo mundo. E eles se contêm pouco, usando sarcasmo e agressividade em igual medida”, disse ele.
O termo "lobo guerreiro" vem dos filmes de ação chineses fortemente nacionalistas lançados em 2015 e 2017, nos quais as forças especiais de elite do Exército de Libertação Popular lutam contra mercenários internacionais.
Desde então, Pequim institucionalizou essa abordagem de confronto com o Ocidente.
Um editorial de maio de 2020 do Global Times, o porta-voz do Partido Comunista Chinês (PPC), atribuiu a mudança à insatisfação pública com a percepção de fraqueza no tom diplomático.
Vários outros diplomatas chineses na América Latina ganharam atenção pela retórica do "lobo guerreiro".
Por exemplo, Xu Bu, embaixador da China no Chile de 2018 a 2020, chamou o então secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, de “hipócrita” após Pompeo, durante uma visita ao Chile em 2019, ter acusado a empresa chinesa Huawei de espionagem.
À medida que a influência da China na América Latina se expandiu, também aumentou a presença dos seus diplomatas. Figuras como Jin Yili, embaixador na Argentina (2019-2023), Zhu Qingqiao, embaixador no Brasil (2020-2023), Wang Wenliang, embaixador no México (2020-2023), e Li Baorong, embaixador no Chile (2020-2023) , passaram a simbolizar a postura diplomática agressiva de Pequim na região.