Sociedade

Perfuração em busca de água em árida cidade petrolífera da Venezuela

Corrupção e décadas de negligência deixaram as torneiras secas. Uma crise hídrica nacional expõe o custo da má gestão, e milhões estão pagando o preço com cortes diários de água.

Em Maracaibo, capital do petróleo da Venezuela, um frenesi de perfuração levou à abertura de dezenas de novos poços — mas o líquido valioso que está sendo bombeado é apenas água, não petróleo. Maracaibo, capital do estado de Zulia, no oeste do país, e antes epicentro do boom petrolífero venezuelano, também foi a primeira cidade do país a receber energia elétrica, que agora falha regularmente. [Jhorman Cruz/AFP]

Por AFP |

MARACAIBO, Venezuela – Em Maracaibo, capital do petróleo da Venezuela, uma onda de perfurações levou à abertura de dezenas de novos poços — mas o líquido valioso que está sendo bombeado é apenas água, não petróleo.

Em um símbolo dos infortúnios da economia em ruínas da Venezuela, a antes próspera cidade petrolífera de 2 milhões de habitantes está seca.

Analistas atribuem a escassez nacional de água potável à corrupção e a anos de subinvestimento e má gestão por parte de governos nacionais e locais, resultando em frequentes cortes de água.

A infraestrutura corroída obrigou os venezuelanos que tentavam proteger escolas, casas, empresas, igrejas e centros de saúde a cavar seus próprios poços — a um custo enorme.

Homem enche tambor com água no bairro Cardoncito 2, na comunidade Antonio Borjas, em Maracaibo, no estado de Zulia, Venezuela. Na antes próspera capital petrolífera da Venezuela, a energia elétrica cai por horas, não há gasolina e a água é racionada por dias a fio. [Alejandro Paredes/AFP]
Homem enche tambor com água no bairro Cardoncito 2, na comunidade Antonio Borjas, em Maracaibo, no estado de Zulia, Venezuela. Na antes próspera capital petrolífera da Venezuela, a energia elétrica cai por horas, não há gasolina e a água é racionada por dias a fio. [Alejandro Paredes/AFP]
Homem coleta água de um poço no bairro Cardoncito 2, na comunidade Antonio Borjas, em Maracaibo, no estado de Zulia, Venezuela. [Alejandro Paredes/AFP]
Homem coleta água de um poço no bairro Cardoncito 2, na comunidade Antonio Borjas, em Maracaibo, no estado de Zulia, Venezuela. [Alejandro Paredes/AFP]

Um poço privado custa entre US$ 1.000 e US$ 6.000, uma fortuna no país caribenho atingido por sanções, onde o salário mínimo mensal é de cerca de US$ 200.

Como resultado, casas que já vêm com poço e gerador prontos — os venezuelanos também convivem com cortes recorrentes de energia — são vendidas por preços altos.

Embora o racionamento de água esteja em vigor nas cidades venezuelanas há anos, a situação em Maracaibo se tornou crítica, com estações de bombeamento quebrando, tubulações antigas vazando e reservatórios secando.

'É uma benção'

Não saiu água das torneiras em certas regiões da cidade por mais de um mês no início de 2025.

Manuel Palmar e outras seis famílias do bairro de classe média baixa Ziruma previram a situação há quatro anos.

Cada um pagou US$ 2.500 para construir um poço de 12 metros de profundidade, capaz de armazenar até cerca de 80.000 litros de água de nascente por semana.

Agora, quando Palmar abre a torneira, a água jorra de graça.

A água não é própria para consumo devido à alta salinidade — a água salgada do Mar do Caribe se infiltra no Lago Maracaibo, um lago costeiro usado como fonte de água doce —, mas "é perfeita para lavar roupas e dar descarga em vasos sanitários", explicou ele.

"É uma bênção!", disse o contador de 34 anos.

Existe uma solução para cada orçamento.

Alguns moradores enchem tambores de 200 litros em postos de abastecimento oficiais ou torneiras comunitárias por US$ 2 a US$ 3.

Outros contratam um caminhão-pipa para encher o tanque do prédio por algo entre US$ 40 e US$ 60.

Alguns até reciclam a água produzida pelos onipresentes aparelhos de ar-condicionado da cidade tropical ou coletam água da chuva.

Mas esses são improvisos rápidos.

Água potável salobra

Nos últimos seis anos, cada vez mais moradores começaram a cavar poços para garantir seu abastecimento em longo prazo para o futuro.

Gabriel Delgado construiu cerca de 20 poços em Maracaibo, inclusive em uma clínica de doenças cardíacas e quatro escolas particulares.

Ele também construiu um na casa de sua sogra: um cilindro de cimento cinza, com um metro e meio de diâmetro, enterrado sob chapas de metal e pedras.

Teias de aranha balançam logo acima do nível da água, mas, assim que ele aciona a bomba, a água jorra.

É cristalina, diferente do líquido amarelado que escorre das torneiras da cidade durante a estação chuvosa, e Delgado a bebe avidamente.

Os venezuelanos precisam obter autorização das autoridades sanitárias e ambientais antes de perfurar um poço e são obrigados a fornecer amostras de água para análise, a fim de garantir que o líquido esteja próprio para consumo após a construção.

Mas nem todos se importam.

Javier Otero, diretor do departamento municipal de águas de Maracaibo, disse à AFP que se deparou com poços artesanais rasos construídos perto de esgotos ou barrancos poluídos.

"Algumas pessoas bebem água que não é potável, que é salobra", afirmou.

O município construiu sete poços para abastecer os bairros mais pobres de Maracaibo.

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