Sociedade

'Senhor das Frutas' da Colômbia lidera luta para salvar espécies de plantas nativas

Colômbia abriga 3.000 espécies de plantas comestíveis, mas uma em cada 10 está em risco de extinção. Só em 2024, o desmatamento para agricultura e cultivo de coca destruiu florestas do tamanho de Hong Kong.

O engenheiro ambiental colombiano e entusiasta de sementes de frutas Gian Paolo Daguer segura uma fruta durante entrevista em Bogotá. Conhecido como o “Senhor das Frutas”, Daguer, 47 anos, lidera uma rede de voluntários dedicada a resgatar frutas raras e ameaçadas de extinção em um dos países com maior biodiversidade do mundo. [Pablo Vera/AFP]
O engenheiro ambiental colombiano e entusiasta de sementes de frutas Gian Paolo Daguer segura uma fruta durante entrevista em Bogotá. Conhecido como o “Senhor das Frutas”, Daguer, 47 anos, lidera uma rede de voluntários dedicada a resgatar frutas raras e ameaçadas de extinção em um dos países com maior biodiversidade do mundo. [Pablo Vera/AFP]

Por AFP |

BOGOTA -- Através do celular no terraço de seu apartamento em Bogotá, o "Senhor das Frutas" da Colômbia descreve os sabores, texturas e usos potenciais de espécies raras para milhares de seguidores nas redes sociais.

O engenheiro ambiental Gian Paolo Daguer, 47 anos, tem a missão de salvar essas iguarias naturais da extinção em um dos países com maior biodiversidade do mundo.

Em um dos muitos vídeos em seu perfil no Instagram, ele exalta as virtudes da lúcuma, fruta tropical pouco conhecida que apresenta aos não iniciados.

A lúcuma tem uma aparência externa semelhante à de um coco, com polpa amarelada que lembra a de um abacate.

Gian Paolo Daguer mostra coleção de sementes de frutas colombianas durante entrevista em Bogotá. Ele lidera uma rede de voluntários que trabalha para preservar esses tesouros naturais da extinção. [Pablo Vera/AFP]
Gian Paolo Daguer mostra coleção de sementes de frutas colombianas durante entrevista em Bogotá. Ele lidera uma rede de voluntários que trabalha para preservar esses tesouros naturais da extinção. [Pablo Vera/AFP]
Chef colombiana Antonuela Ariza apresenta pratos feitos com frutas silvestres como camu-camu, cupuaçu e goiaba azeda em seu restaurante em Bogotá. Esses ingredientes nativos fazem parte de um movimento culinário crescente liderado pelo conservacionista de frutas Gian Paolo Daguer, que compartilha os sabores e o potencial das frutas raras da Colômbia com milhares de seguidores online. [Raúl Arboleda/AFP]
Chef colombiana Antonuela Ariza apresenta pratos feitos com frutas silvestres como camu-camu, cupuaçu e goiaba azeda em seu restaurante em Bogotá. Esses ingredientes nativos fazem parte de um movimento culinário crescente liderado pelo conservacionista de frutas Gian Paolo Daguer, que compartilha os sabores e o potencial das frutas raras da Colômbia com milhares de seguidores online. [Raúl Arboleda/AFP]

“Esta é considerada a rainha das frutas peruanas”, diz Daguer, enquanto explica a genealogia e a distribuição geográfica da lúcuma; depois, ele a abre e dá uma mordida.

“É uma fruta pouco suculenta... Pode ser consumida fresca, mas é muito seca. Mesmo assim, tem um sabor forte de caramelo”, descreve.

Assim como a lúcuma, diversas frutas nativas da Colômbia e da região são pouco consumidas em um país onde espécies internacionalmente populares como manga, mamão, melancia e abacaxi são mais conhecidas.

Algumas frutas locais estão agora em risco de extinção por desconhecimento sobre suas propriedades e outros fatores como desmatamento.

“À medida que nossa dieta se torna mais homogeneizada, todos comemos a mesma coisa em todo o mundo, então estas espécies (nativas) ficam em segundo plano”, explicou à AFP Carolina Castellanos, bióloga do Instituto Humboldt, um organismo de pesquisa da biodiversidade em Bogotá.

“E isso significa que, à medida que as consumimos menos, elas também crescem menos... e é mais fácil desaparecerem”, alertou.

Uma das frutas ameaçadas da coleção de Daguer é o “churumbelo”, baga nativa do departamento de Boyaca, onde seu ambiente natural é prejudicado pela agricultura e pela mineração.

“Seu sabor é doce e refrescante, lembrando o de uma pêra”, relata Daguer sobre o exemplar que levou anos para ser rastreado.

Desaparecendo antes de serem encontradas

Um estudo realizado em 2022 pelo Instituto Humboldt e outros órgãos de pesquisa mostrou que o país abriga pelo menos 3.000 espécies de plantas “comestíveis”.

Mas uma em cada dez – possivelmente mais – está em risco de extinção.

Em 2024, a Colômbia perdeu uma área de floresta quase do tamanho de Hong Kong devido ao desmatamento para agricultura e cultivo de coca, de acordo com o Ministério do Meio Ambiente. A coca é o principal ingrediente usado na produção de cocaína.

Em números cada vez maiores, jardins domésticos e sacadas em todo o país ostentam árvores frutíferas cultivadas a partir de sementes que Daguer envia aos seguidores interessados.

Eles pagam apenas o custo do envio pelo correio.

Seu canal "frutas_colombianas" tem mais de 108 mil inscritos, e Daguer também lidera uma rede de bate-papo no WhatsApp em que biólogos, agricultores e chefs compartilham conhecimentos sobre frutas raras e organizam trocas de sementes.

“Esse tipo de aprendizagem muitas vezes não é documentado pela ciência, mas, com esse interesse do público, todos acabamos aprendendo”, disse à AFP Daguer, que desde criança tem paixão por descobrir frutas raras.

Seu trabalho acabou contribuindo para a catalogação pela primeira vez, em 2024, do quinguejo, uma baga escura, semelhante ao mirtilo, que cresce em Nuquí – pequena cidade no remoto noroeste do país.

Daguer teme que as frutas estejam desaparecendo da natureza antes mesmo de serem descobertas.

“Definitivamente, não devemos continuar pensando que podemos seguir destruindo os ecossistemas”, alertou.

A natureza precisa de ajuda

A natureza precisará da ajuda humana para se recuperar, acrescentou o homem apelidado de “Senhor das Frutas” pelos seus seguidores.

“E a recuperação se consegue através do replantio.”

A chef Antonuela Ariza, uma das colaboradoras de Daguer, tenta fazer sua parte acrescentando frutas raras ao cardápio de seu restaurante "Mini-Mal" em Bogotá, para apresentar novos sabores aos clientes e promover a biodiversidade.

As opções incluem uma maionese feita com camu-camu - semelhante a uma uva -, um molho de pimenta-preta amazônica e um coquetel de cupuaçu, que lembra o cacau.

“O que não comemos se perde”, apontou Ariza.

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