Segurança

Expansão binacional do ELN agrava instabilidade na fronteira entre Colômbia e Venezuela

Negociações de paz com o Exército de Libertação Nacional são cada vez mais difíceis, uma vez que o grupo se transformou em uma organização criminosa binacional que protege o regime de Maduro em Caracas.

(Da esquerda para a direita) Delegados do Exército de Libertação Nacional (ELN) Isabel Torres, Aureliano Carbonell, Nicolás Rodríguez e Bernardo Téllez dialogam durante evento relacionado às negociações de paz com o governo colombiano em Caracas, em setembro de 2023. Uma bandeira venezuelana é visível ao fundo. [Yuri Cortez/AFP]
(Da esquerda para a direita) Delegados do Exército de Libertação Nacional (ELN) Isabel Torres, Aureliano Carbonell, Nicolás Rodríguez e Bernardo Téllez dialogam durante evento relacionado às negociações de paz com o governo colombiano em Caracas, em setembro de 2023. Uma bandeira venezuelana é visível ao fundo. [Yuri Cortez/AFP]

Por Edelmiro Franco V. |

BOGOTÁ - O movimento guerrilheiro Exército de Libertação Nacional (ELN) da Colômbia solidificou sua presença como uma organização criminosa binacional que opera tanto na Colômbia quanto na Venezuela, como evidenciado pela recente crise humanitária desencadeada por suas ações na região de Catatumbo.

Após o Acordo de Paz de 2016 entre o governo colombiano e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), o ELN se tornou o grupo guerrilheiro ativo há mais tempo na América Latina.

Em novembro de 2020, pesquisadores da Universidad del Norte (Barranquilla) publicaram um estudo intitulado “ELN na Venezuela: Uma abordagem descritiva da binacionalidade do movimento guerrilheiro”.

“Uma das principais preocupações do Exército de Libertação Nacional é sua expansão e consolidação nos municípios fronteiriços e, consequentemente, sua presença em diferentes estados da Venezuela”, alerta o documento.

Desabrigada pelos recentes confrontos entre grupos armados, Gladis Angarita usa o celular enquanto se abriga em Tibú, Norte de Santander, Colômbia. [Schneyder Mendoza/AFP]
Desabrigada pelos recentes confrontos entre grupos armados, Gladis Angarita usa o celular enquanto se abriga em Tibú, Norte de Santander, Colômbia. [Schneyder Mendoza/AFP]
Soldados colombianos se preparam para operações contra os rebeldes do ELN em Catatumbo, no Cantão Militar de San Jorge, em Cúcuta, Colômbia. [Schneyder Mendoza/AFP]
Soldados colombianos se preparam para operações contra os rebeldes do ELN em Catatumbo, no Cantão Militar de San Jorge, em Cúcuta, Colômbia. [Schneyder Mendoza/AFP]

Negociar a paz com um grupo guerrilheiro binacional é particularmente difícil, uma vez que o ELN já não opera apenas na Colômbia, argumentam os autores.

Qualquer acordo que envolva o grupo exigiria a participação da Venezuela.

Na época do acordo de paz com as FARC, o ELN tinha menos de 3.000 combatentes armados. No entanto, este número duplicou até 2023, informou La Silla Vacia em março passado, citando fontes do Ministério da Defesa da Colômbia.

E continuou a aumentar em 2024, segundo os serviços de inteligência militar, embora o contingente exato de combatentes do ELN permaneça incerto.

Defendendo o regime de Maduro

A natureza binacional do ELN tem dois aspectos fundamentais: a presença territorial na Venezuela e uma mudança em sua composição, uma vez que deixou de ser exclusivamente colombiana e passou a recrutar ativamente venezuelanos, explicou ao Entorno Jorge Mantilla, doutorando em criminologia na Universidade de Illinois e estudioso do crime, da segurança e do conflito colombiano.

As unidades do Leste e do Nordeste do ELN, que operam ao longo dos 2.219 km da fronteira entre a Colômbia e a Venezuela, estão cada vez mais fazendo “exercícios de recrutamento no lado venezuelano”, revelou Mantilla.

A orientação ideológica do grupo também evoluiu, acrescentou ele.

“O ELN deixou de lutar por uma revolução socialista na Colômbia para defender a revolução bolivariana [um eufemismo para o regime de Nicolás Maduro em Caracas], que se tornou a sua principal prioridade. Esse alinhamento tem sido fundamental para seu crescimento e consolidação na última década.”

A presença binacional do Exército de Libertação Nacional está enraizada em sua profunda integração nas estruturas locais de ambos os lados da fronteira, particularmente na Venezuela, onde exerce influência sobre o poder comunitário, incluindo as autoridades paroquiais e administrativas, disse Mantilla.

O grupo também se envolveu em atividades ilícitas, como “a exploração pecuária, a extorsão ligada à travessia das fronteiras e o controle das rotas migratórias. Isto inclui a migração regular e os deslocamentos de trabalhadores transfronteiriços, bem como o tráfico de seres humanos, o contrabando de gasolina e o comércio ilegal de carne bovina, entre outras atividades”, destacou ele.

Ligações com o regime de Caracas

Nenhum documento oficial mostra explicitamente ordens de Maduro direcionando apoio ao ELN, afirmou Mantilla.

Mas “a observação direta e os testemunhos indicam patrulhas conjuntas ao longo da fronteira e um controle coordenado das travessias por ambas as forças”, disse ele.

Entre 2019 e 2022, o ELN e os militares venezuelanos realizaram operações conjuntas nas zonas rurais de Cúcuta e Puerto Santander, na Colômbia, bem como em La Fría, Boca de Brisa e Urueña, na Venezuela.

Essas operações quase dizimaram o grupo narco-paramilitar Los Rastrojos, que, de acordo com a InSight Crime, era originário do poderoso Cartel Norte del Valle antes de sua queda.

Mantilla descreveu os laços do ELN com o regime de Caracas como uma relação de coordenação, cooperação e delegação, marcada por “interesse mútuo e interdependência, beneficiando ambos os lados”.

Mas a extensão desta relação permanece incerta.

“Ainda não se sabe se esses laços existem nos mais altos níveis do governo venezuelano, dentro das estruturas de comando militar nas zonas de defesa integral ou se são mais localizados”, observou ele.

Ele destacou Fredy Bernal, governador do estado de Táchira, na Venezuela, como um dos principais facilitadores da coordenação do ELN, que reforça a presença do grupo na região e mantém uma relação estreita com a guerrilha, especialmente no Norte de Santander.

Catatumbo: luta pelo controle territorial

O ELN, juntamente com duas facções dissidentes das FARC, atua na fronteira entre a Colômbia e a Venezuela, sobretudo na estratégica região de Catatumbo.

Esta zona foi palco de violentos confrontos pelo controle territorial, que deixaram pelo menos 80 mortos e quase 50.000 pessoas desalojadas em 2025, segundo um relatório das Nações Unidas.

Além disso, grupos como o autoproclamado Exército Gaitanista Colombiano (EGC), o Tren de Aragua, La Línea, AK 47 e outras organizações criminosas transnacionais mantêm presença militar na região.

Estes grupos rebeldes têm as seguintes dimensões, segundo informações dos serviços de inteligência militar colombianos em 2023: o ELN conta com 6.000 membros; o Estado-Maior Central (EMC), 4.000; a Segunda Marquetalia,1.750; e o EGC, 5.000.

Enquanto isso, os cartéis de Sinaloa e Jalisco Nueva Generación estão envolvidos em operações de tráfico de drogas. Eles supervisionam a produção de cocaína e lavam dinheiro na região.

“Os cartéis de Sinaloa e Jalisco Nueva Generación estão ativos na Colômbia para monitorar a qualidade e a quantidade de cloridrato de cocaína, negociar embarques e estabelecer preços. Eles adquiriram várias propriedades no Norte de Santander, onde operam diversos esquemas de lavagem de dinheiro”, explicou Mantilla.

Este conflito persistente pelo domínio territorial intensificou a crise humanitária na região de Catatumbo, provocando um aumento da violência, deslocamento forçado e graves consequências para a população civil.

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