Ambiente
Danos ambientais e preocupações com concorrência justa alimentam discórdia entre Peru e China sobre porto de Chancay
Aclamado como um marco nas relações sino-peruanas, o porto de Chancay está agora no centro de uma tempestade.
![Autoridades inspecionam a praia de Chorrillos, onde pneus descartados e detritos permanecem espalhados ao longo da costa. A estatal chinesa Cosco Shipping enfrenta uma queixa criminal por suposta violação de compromissos ambientais vinculados à construção do megaporto de Chancay, no Peru. [Freddlich]](/gc4/images/2025/06/27/50977-chancay11-600_384.webp)
Por John Caicedo |
LIMA – Desde a sua inauguração, em novembro de 2024, o megaporto de Chancay colocou o Peru no centro de um polêmico debate sobre soberania econômica e concorrência de mercado.
Enquanto Pequim exalta o terminal financiado pela China como um impulsionador do comércio bilateral, as autoridades peruanas questionam o modelo operacional do megaprojeto, que é liderado pela estatal Cosco Shipping.
Em maio, o órgão regulador de investimentos em transportes no Peru (Ositrán) solicitou ao órgão nacional de defesa da concorrência (Indecopi) que avaliasse se as condições em Chancay garantem uma concorrência justa, especialmente em comparação com outros portos, como o de Callao.
Após entrevistas com empresas de navegação, exportadores, importadores e autoridades regionais, o Indecopi concluiu que Chancay não oferece salvaguardas para concorrência aberta.
![Contêiner é içado no porto de Chancay, no Peru, em novembro de 2024. [Li Mengxin/Xinhua via AFP]](/gc4/images/2025/06/27/50978-chancay2-600_384.webp)
Com base nessas conclusões, o governo planejará agora regular as tarifas no porto por meio do Ositrán, com uma proposta final prevista para 24 de julho.
A Cosco, que detém o controle acionário do porto, reagiu de forma rápida e dura. Em comunicado, a empresa alertou que está avaliando “cursos de ação relevantes dentro do atual quadro legal” e rejeitou qualquer interferência estatal nos seus preços ou práticas operacionais.
A Cosco lidera o investimento US$ 5 bilhões juntamente com a mineradora peruana Volcán e vê a intervenção tarifária como uma ameaça à sua autonomia.
A disputa aprofundou as divisões políticas em Lima.
Alguns economistas defendem a intervenção estatal como essencial para conter o risco de abuso de domínio de mercado. Outros argumentam que a decisão do Indecopi se baseia em dados desatualizados e não reflete a complexidade do atual cenário logístico do Peru.
Megaporto e costa poluída
As tensões ambientais alimentam a polêmica.
Em janeiro, um grupo de cidadãos de Chancay apresentou uma queixa criminal acusando a Cosco de poluir a praia de Chorrillos, que fica próxima ao local de obras.
Segundo o coletivo Freddlich (Frente de Defesa pela Dignidade e Liberdade de Chancay), a instalação de "geotubos" cheios de areia, destinados a reduzir a erosão costeira, modificou severamente a paisagem natural.
“Aquele que polui deve reparar [os danos]”, disse o advogado Ricardo Torres, representante do Freddlich, ao exigir uma investigação criminal.
O coletivo também entrou com duas ações judiciais, não apenas contra a Cosco, mas também contra o Estado peruano por não ter mitigado os danos ambientais.
As petições acusam o Ministério dos Transportes, o Ministério do Meio Ambiente e outros órgãos de negligenciarem seus deveres de proteção dos ecossistemas costeiros.
Documentos apresentados à justiça citam um estudo de impacto ambiental de 2020 que alertava para “graves impactos” nas praias ao norte do empreendimento. O grupo alega que, durante a obra, pneus velhos foram usados como base para a colocação dos geotubos, que desde então se espalharam ao longo da costa, poluindo a área e atrapalhando o turismo e o acesso público.
Diante da oposição local, os críticos do impulso global da China a setores de infraestrutura trazem novamente à tona preocupações com a degradação ambiental, o controle dos monopólios e as ambições estratégicas de Pequim.
Os Estados Unidos também alertaram o Peru sobre os riscos, no longo prazo, de entregar infraestruturas fundamentais a empresas apoiadas pelo governo chinês.
A inauguração do porto no final de 2024, com a presença do presidente chinês Xi Jinping, sinalizou um marco simbólico nas relações sino-peruanas. Menos de um ano depois, o investimento emblemático tornou-se um ponto de disputa que confronta promessas comerciais, interesses regulatórios e o escrutínio geopolítico.