Economia

Laços de Ortega com China deixam Nicarágua ainda mais endividada

Regime de Daniel Ortega aposta alto na China, mas novos empréstimos poderão elevar a dívida da Nicarágua para US$ 1,19 bilhão e submeter o país a monitoramento na internet ao estilo chinês.

Delegação nicaraguense liderada por Laureano Ortega Murillo (centro), filho dos copresidentes do regime, Daniel Ortega e Rosario Murillo, posa com autoridades chinesas durante uma visita a Pequim em meados de maio, quando os dois lados assinaram vários acordos para expandir a conectividade digital na zona rural da Nicarágua. [El 19 Digital]
Delegação nicaraguense liderada por Laureano Ortega Murillo (centro), filho dos copresidentes do regime, Daniel Ortega e Rosario Murillo, posa com autoridades chinesas durante uma visita a Pequim em meados de maio, quando os dois lados assinaram vários acordos para expandir a conectividade digital na zona rural da Nicarágua. [El 19 Digital]

Por Roberto Orozco B. |

SAN JOSÉ, Costa Rica – O regime de Daniel Ortega negocia com empresas chinesas novos empréstimo no valor total de mais de US$ 213 milhões. Se esses acordos forem concluídos, a dívida da Nicarágua com a China subiria para US$ 1,19 bilhão, um número alarmante para um dos países mais pobres da América Latina.

Em 29 de maio, o La Gaceta, publicação oficial do governo da Nicarágua, divulgou ordens presidenciais autorizando um funcionário do Ministério das Finanças a assinar contratos com a Zhengzhou Coal Mining Machinery Group (ZMJ) e a China Iconic Technology Company Limited.

O acordo com a ZMJ totaliza US$ 84,9 milhões, a serem disponibilizados em duas parcelas. Os recursos serão usados na compra de produtos e serviços para o Projeto de Conectividade Digital, liderado pela agência estatal de telecomunicações TELCOR em parceria com a polêmica gigante tecnológica chinesa Huawei.

O projeto visa reduzir a exclusão digital na Nicarágua com a instalação de 200 estações-base para melhorar a cobertura móvel, fixa e de internet, afirmaram os meios de comunicação estatais, incluindo o El 19 Digital no fim de maio.

A TELCOR é dirigida por Nahima Díaz, filha do diretor-geral da Polícia Nacional, Francisco Díaz, e esposa de Maurice Ortega Murillo, filho do casal presidencial Daniel Ortega e Rosario Murillo. Uma recente reforma constitucional elevou Rosario Murillo a copresidente, consolidando o controle do poder pela família.

Em meados de abril, a funcionária designada da TELCOR discutiu negócios com o presidente da Huawei na América Latina, Xhou Danjin, durante uma visita ao campus da empresa em Shenzhen, na China. O projeto de sete anos tem como alvo as regiões rurais e o Caribe, onde o acesso à internet ainda é mínimo.

Mas especialistas em informática da Universidade Nacional de Engenharia (UNI) alertam que o projeto pode atender a mais do que apenas objetivos de conectividade.

“O governo (Ortega) quer controlar a internet e está tomando passos cada vez maiores para conseguir isso”, disse ao Entorno “Martín”, um engenheiro de computação da UNI que pediu anonimato por medo de retaliação. "A Huawei foi acusada de espionar as comunicações em vários países e, com o autoritarismo de Ortega, surgiria a combinação perfeita para o controle das comunicações."

Em 2024, o regime aprovou a Lei Geral de Telecomunicações Convergentes, lançando as bases para um aumento do investimento público-privado em infraestruturas digitais. Na costa caribenha, já foram instalados 2.800 km de cabos de fibra ótica, 65 torres foram erguidas e 14 centros de saúde receberam tecnologia digital.

Um segundo empréstimo chinês, mais controle

O segundo empréstimo, com a China Iconic Technology Company Limited, supera US$ 128,1 milhões. Os recursos financiarão estudos de viabilidade e engenharia para ampliação e modernização do Centro Logístico Julia Herrera de Pomares, a 10 km de Corinto, principal porto do país.

Segundo o governo da Nicarágua, o centro agilizará a inspeção, a segurança e o armazenamento de cargas. A instalação de 102.000 metros quadrados já abriga um posto de combustível e um estacionamento para caminhões pesados.

Mas as preocupações com os parceiros chineses são grandes.

A ZMJ, uma das construtoras, é alvo de críticas em razão de investimentos questionáveis. No fim de 2023, a empresa afirmou que havia investido mais de US$ 41 milhões em produtos fiduciários vinculados à Huisheng PE, atualmente investigada por fraude.

As autoridades chinesas detiveram os principais executivos da Huisheng, mas recuperaram menos de 10% dos fundos da ZMJ. O escândalo provocou uma queda nas ações da empresa e desencadeou dúvidas sobre sua governança financeira.

À medida que o regime de Ortega aprofunda seus laços com a China, críticos alertam que os empréstimos e parcerias não só consolidam o controle autoritário, mas também expõem o país a dependências financeiras e tecnológicas que poderiam ser devastadoras.

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