Direitos Humanos

O menino levado por Pequim: 30 anos sem Panchen Lama

Quase três décadas após autoridades chinesas sequestrarem Gedhun Choekyi Nyima aos 6 anos de idade, Pequim ainda se recusa a quebrar silêncio.

Membros da Associação de Mulheres Tibetanas protestam no Jantar Mantar, em Nova Déli, Índia, exigindo a libertação do 11º Panchen Lama, Gedhun Choekyi Nyima. O Dalai Lama reconheceu Gedhun em 1995, quando ele tinha 6 anos. As autoridades chinesas prenderam o menino logo depois. Desde então, ele não foi mais visto. [Arrush Chopra/NurPhoto/AFP]
Membros da Associação de Mulheres Tibetanas protestam no Jantar Mantar, em Nova Déli, Índia, exigindo a libertação do 11º Panchen Lama, Gedhun Choekyi Nyima. O Dalai Lama reconheceu Gedhun em 1995, quando ele tinha 6 anos. As autoridades chinesas prenderam o menino logo depois. Desde então, ele não foi mais visto. [Arrush Chopra/NurPhoto/AFP]

Por Entorno |

Gedhun Choekyi Nyima é uma das pessoas desaparecidas mais famosas do mundo.

Em 1995, as autoridades chinesas o retiraram de sua casa no Tibet quando ele tinha apenas 6 anos de idade. O menino tinha acabado de ser reconhecido pelo Dalai Lama como o 11º Panchen Lama, a segunda figura mais importante do budismo tibetano. Esse reconhecimento, além do temor do governo chinês com relação aos seus impactos, transformou o menino em um símbolo de controle político e repressão religiosa.

Desde então, ele não foi mais visto.

Gedhun desapareceu em 17 de maio de 1995, três dias após o Dalai Lama anunciar seu reconhecimento. Ele foi detido por autoridades, juntamente com sua família, em Lhari, pequeno condado em Nagqu, uma vasta região fustigada pelo vento na Região Autônoma do Tibete. Trinta anos depois, seu destino permanece um mistério.

Membros da Associação das Mulheres Tibetanas (ao centro) marcham na Praça Samvidhan, em Nagpur, Índia, pedindo a libertação de Gedhun Choekyi Nyima, o 11º Panchen Lama, que desapareceu em 1995 após ser reconhecido pelo Dalai Lama. Apesar dos apelos globais, seu paradeiro permanece desconhecido. [Aniruddhasingh Dinore/The Times of India/AFP]
Membros da Associação das Mulheres Tibetanas (ao centro) marcham na Praça Samvidhan, em Nagpur, Índia, pedindo a libertação de Gedhun Choekyi Nyima, o 11º Panchen Lama, que desapareceu em 1995 após ser reconhecido pelo Dalai Lama. Apesar dos apelos globais, seu paradeiro permanece desconhecido. [Aniruddhasingh Dinore/The Times of India/AFP]

Organizações de direitos humanos, governos estrangeiros e a Organização das Nações Unidas têm exigido repetidamente sua libertação. Estados Unidos, Canadá, União Europeia, Reino Unido, Austrália, Índia e a Anistia Internacional condenaram a recusa da China em reconhecer seu paradeiro ou confirmar sua segurança.

O caso de Gedhun é hoje um dos exemplos mais antigos de desaparecimento forçado da história moderna. Se ele ainda estiver vivo, teria completado 36 anos em 25 de abril.

Pequim divulgou a única declaração conhecida sobre sua situação em 2020, alegando que Gedhun havia concluído a universidade e conseguido um emprego. Mas as autoridades chinesas nunca permitiram verificação independente, e ninguém viu fotos recentes ou se encontrou com ele. Pequim não autoriza a visita de nenhum observador externo.

Tibetanos no exílio e seus apoiadores nunca pararam de fazer perguntas. Todos os anos, desde o sequestro do menino, eles fazem vigílias de oração, passeatas de protesto e cerimônias públicas em todo o mundo, especialmente em Dharamsala, na Índia, onde fica a sede do governo tibetano no exílio.

Em 2025, eles planejam comemorar o 30º aniversário com novos apelos por sua libertação, apesar da censura de Pequim.

Um relatório de 2020 de Jigme Tsering, representante do Dalai Lama para a América Latina, destacou a preocupação persistente. "Organizações internacionais de direitos humanos têm apelado repetidamente pela libertação de Gedhun Choekyi Nyima e pela confirmação de seu bem-estar", escreveu Tsering. "Muitos governos do mundo emitiram declarações sobre sua detenção. Mas ninguém foi autorizado a visitá-lo."

Nascimento sagrado, desaparecimento rápido

Gedhun nasceu em abril de 1989, filho de um médico e uma enfermeira, em Nagqu, uma das regiões habitadas mais altas do mundo, mais de 4.500 metros acima do nível do mar.

Conhecida por seus invernos secos e verões chuvosos, a região fica no coração do Planalto Qinghai, no norte do Tibete. Sua população, em 1995, era estimada em menos de 400.000 habitantes, a maioria budistas tibetanos com uma profunda herança cultural e religiosa.

No budismo tibetano, o Panchen Lama desempenha o papel crucial de identificar o próximo Dalai Lama. Pequim compreendeu tanto o poder dessa tradição quanto seus riscos políticos. O atual Dalai Lama fugiu do Tibete após a invasão chinesa de 1959 e, desde então, tornou-se o líder espiritual dos exilados tibetanos e um símbolo da resistência ao domínio chinês.

O Panchen Lama anterior, Choekyi Gyaltsen, morreu repentinamente em janeiro de 1989, aos 51 anos. Autoridades atribuíram a morte a um ataque cardíaco. Mas algumas fontes afirmam que ele morreu em circunstâncias suspeitas, após criticar as políticas chinesas no Tibete. Rumores de envenenamento persistem.

Os líderes chineses temiam que o próximo Panchen Lama herdasse esse peso político. Quando o Dalai Lama nomeou Gedhun, agiram rapidamente, removendo-o da vista do público e nomeando um substituto escolhido a dedo. Muitos agora dizem que Pequim pretende seguir o mesmo plano após a morte do atual Dalai Lama: criar seu próprio líder espiritual e controlar o budismo tibetano internamente.

Em maio de 2020, a BBC noticiou que as autoridades chinesas mantiveram a localização de Gedhun em segredo por décadas. Em determinado momento, uma autoridade disse ao South China Morning Post que o menino morava na província de Gansu, mas não apresentou provas.

Anteriormente, em 2000, o Secretário de Relações Exteriores britânico, Robin Cook, disse ao Parlamento que autoridades chinesas insistiam que o menino estava seguro e saudável e que seus pais não queriam interferência internacional. Eles até mostraram fotos de uma suposta residência, mas negaram os pedidos de acesso. Ninguém conseguiu comprovar a alegação.

Até hoje, a única imagem confirmada de Gedhun é um retrato feito no início de 1995 pela delegação que buscava a reencarnação do Panchen Lama. Ele mostra um menino com as bochechas vermelhas de frio, alheio ao papel que havia sido escolhido para desempenhar, ou ao destino que o aguardava.

Gostou desta matéria?


Captcha *