Economia

Analistas comparam resposta de Arce à escassez de combustível com 'medidas pandêmicas'

Presidente boliviano admitiu incapacidade do governo para atender à demanda de combustível e anunciou dez medidas para enfrentar a escassez. No entanto, nenhuma delas aborda a raiz do problema, argumentam líderes de vários setores.

Mulher bate panelas durante manifestação em La Paz, em protesto contra a escassez de combustível e a crise do dólar. [Aizar Raldes/AFP]
Mulher bate panelas durante manifestação em La Paz, em protesto contra a escassez de combustível e a crise do dólar. [Aizar Raldes/AFP]

Por Aurora Lane |

LA PAZ – A escassez de combustível na Bolívia, impulsionada pela crise do dólar, obrigou o presidente Luis Arce a implementar medidas que lembram as utilizadas durante a pandemia de COVID-19.

Enquanto a Bolívia enfrenta uma crise energética cada vez maior, o governo reconhece que não pode resolver o problema rapidamente.

Na noite de 12 de março, Arce fez um pronunciamento à nação, no qual anunciou 10 medidas para reduzir o consumo de combustível, mas sem fornecer um cronograma claro para acabar com a crise.

Há mais de um ano que a Bolívia sofre com a escassez de diesel e gasolina, mas a situação piorou no início de março, quando o governo admitiu que já não podia satisfazer à demanda devido à falta da moeda estrangeira.

Manifestantes marcham em La Paz com cartazes para denunciar a crise econômica boliviana e expressar oposição ao governo de Luis Arce, em 13 de janeiro. [Jorge Bernal/AFP]
Manifestantes marcham em La Paz com cartazes para denunciar a crise econômica boliviana e expressar oposição ao governo de Luis Arce, em 13 de janeiro. [Jorge Bernal/AFP]

O Entorno consultou analistas que salientaram que as “medidas pandêmicas” de Arce, incluindo aulas virtuais, trabalho remoto e redução dos transportes públicos, espelhando as ações tomadas em 2020 para enfrentar a crise de COVID-19. Essas providências afetaram gravemente a economia da Bolívia.

“São medidas que fazem lembrar a época da pandemia, com trabalho remoto, horários estendidos e cronogramas especiais para o setor da educação, como se nos dissessem que isso é o novo normal”, afirmou Luis Romero, presidente do Colégio de Economistas de Tarija, em entrevista ao Entorno.

Estas ações governamentais são “paliativas” e não soluções estruturais, acrescentou Romero.

Questão central

O empresário boliviano Branko Marinkovic, ex-ministro da Economia e das Finanças, manifestou seu descontentamento em sua conta no X.

As “medidas da COVID” de Arce não constituem uma solução real para a crise atual, afirmou ele.

“A única resposta deste governo incapaz é confinar as pessoas, como durante a pandemia. Em vez de oferecerem soluções reais, estes comunistas inúteis são capazes apenas de impor medidas paliativas: trabalhadores enclausurados nos seus empregos e estudantes limitados a salas de aula virtuais”, escreveu Marinkovic.

Nos últimos dias, longas filas de veículos se formaram nos postos de gasolina em toda a Bolívia. O setor agrícola está alertando para uma potencial crise alimentar devido à escassez de diesel necessário para a colheita de verão. Vários outros segmentos já declararam estado de emergência.

Nenhuma das medidas propostas aborda a questão central: a falta de dólar para importar combustível, dizem as fontes.

A escassez de dólares no país andino se deve principalmente ao rápido declínio de suas reservas internacionais, que passaram de US$ 15 bilhões em 2014 para apenas US$ 1,8 bilhão em 2024, de acordo com o Banco Central da Bolívia (BCB).

Este esgotamento conduziu a uma escassez de dólar no mercado interno e agravou o perfil de risco do país junto às agências internacionais de classificação.

Em vez de reduzir a despesa pública, o governo de Arce manteve os onerosos subsídios aos combustíveis e canalizou mais fundos para as empresas públicas – muitas das quais funcionam com déficit.

Opções limitadas

As 10 medidas anunciadas pelo governo foram alvo de fortes críticas de vários setores.

“Arce está apenas restringindo a demanda, o que vai encolher ainda mais a economia e nos levar a uma situação semelhante à pandemia”, alertou Alvaro Rios, ex-ministro de hidrocarbonetos, ao Entorno.

Em 14 de março, Arce sugeriu que a escassez de dólar poderia ser resolvida com a aprovação de US$ 1,6 bilhão em empréstimos que estão sendo analisados pelo Congresso. No entanto, dadas as divisões dentro do partido no poder, a aprovação desses empréstimos parece improvável em curto prazo.

“Agora, o governo de Arce não tem muitas alternativas. A única ação que resta até novembro (quando termina seu mandato) é obter financiamento, seja de fontes externas ou internas, sendo esta última a opção mais provável”, disse o analista Romero.

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