Sociedade

Orquestra paraguaia que transforma lixo em música se apresenta em Londres

Objetivo era envolver adolescentes na música para afastá-los da violência e do crime, mas eles acabaram tocando para convidados em prédio do século 19 perto do Palácio de Buckingham.

Integrantes da Orquestra de Instrumentos Reciclados de Cateura, do Paraguai, ensaiam antes de apresentação na Lancaster House, em Londres. [Justin Tallis/AFP]
Integrantes da Orquestra de Instrumentos Reciclados de Cateura, do Paraguai, ensaiam antes de apresentação na Lancaster House, em Londres. [Justin Tallis/AFP]

Por AFP |

LONDRES – Apenas dois anos atrás, Lucas Cantero não sabia nada de música.

Em 25 de janeiro, o paraguaio de 16 anos tocou seu tambor — feito de madeira de paletes descartada, painéis de raio-X e hastes de cobre — no luxuoso palácio Lancaster House, em Londres.

"Nunca imaginei que de pedaços de madeira e raios-X pudesse sair música", disse o integrante da Orquestra de Instrumentos Reciclados de Cateura.

O conjunto jovem e pouco convencional recebeu o nome do maior aterro sanitário da capital paraguaia, Assunção.

Integrantes da Orquestra de Instrumentos Reciclados de Cateura, do Paraguai, saem para se apresentar na Lancaster House, em Londres. [Justin Tallis/AFP]
Integrantes da Orquestra de Instrumentos Reciclados de Cateura, do Paraguai, saem para se apresentar na Lancaster House, em Londres. [Justin Tallis/AFP]

Os membros, moradores pobres de Assunção, fazem seus instrumentos com latas de tinta, canos, barris de óleo, escovas para sapatos e uma variedade de outros resíduos.

Eles produzem de tudo, de violinos a trompetes.

Cerca de 10 membros do grupo de 60 pessoas estavam em Londres, onde deslumbraram 200 convidados — diplomatas, parlamentares e empresários — no edifício do século 19 administrado pelo Ministério das Relações Exteriores da Grã-Bretanha, perto do Palácio de Buckingham.

Seu repertório vai de Mozart a Coldplay, passando por Beatles e Frank Sinatra.

O grupo foi lançado em 2007 e já se apresentou em cerca de 50 países.

"Criar uma banda com esses instrumentos reciclados chamou a atenção de muita gente", disse à AFP o diretor da orquestra, Flavio Chávez, 49 anos.

"Não só pelos instrumentos, mas também pelo talento desses jovens em transformar lixo em música."

Prevenção da violência

Chávez teve a ideia do projeto há quase duas décadas, quando foi trabalhar como técnico no aterro sanitário de Cateura.

"Também sou músico e comecei espontaneamente a dar aulas para as crianças da comunidade do aterro", explicou.

A ideia era atrair os adolescentes para a música e afastá-los da violência.

"É um bairro perigoso onde muitos acontecimentos fazem com que a pessoa mude, se torne má.", observou Cantero.

Eles começaram fazendo instrumentos "simples" para aprender, sem pensar no momento em que fariam concertos, disse Chávez.

Uma escola de música e uma orquestra acabaram surgindo.

A escola hoje ensina cerca de 450 crianças que, como Cantero, esperam progredir na orquestra.

"Eles aprendem praticamente do zero com a gente, a maioria deles, e ganham um lugar na orquestra", disse Chávez.

'Cama velha e escova'

Os adolescentes começam com "apresentações locais, primeiro no Paraguai, na comunidade de onde vêm, depois se inscrevem para formar a orquestra e depois fazem turnês pelo mundo", acrescentou.

Willian Wilson López, um dos 10 em Londres, lidera a equipe responsável pela fabricação de instrumentos de corda.

"Meu contrabaixo é feito de um barril de óleo, parte de uma cama velha e uma escova para sapatos", explicou.

"Nunca pensamos que isso criaria uma ponte que nos levaria tão longe", disse o ex-novato musical sobre a iniciativa comunitária.

A renda proveniente dos concertos da orquestra é parcialmente investida para ajudar a população carente de Cateura.

A iniciativa recebeu um grande impulso há cerca de uma década, quando o cineasta americano Graham Townsley lançou um documentário sobre o projeto, "Landfill Harmonic".

Isso levou bandas de rock como Metallica e Megadeth a pedir para tocar com a orquestra.

Gostou desta matéria?


Captcha *