Sociedade
Orquestra paraguaia que transforma lixo em música se apresenta em Londres
Objetivo era envolver adolescentes na música para afastá-los da violência e do crime, mas eles acabaram tocando para convidados em prédio do século 19 perto do Palácio de Buckingham.
![Integrantes da Orquestra de Instrumentos Reciclados de Cateura, do Paraguai, ensaiam antes de apresentação na Lancaster House, em Londres. [Justin Tallis/AFP]](/gc4/images/2025/01/30/48970-paraguay1-600_384.webp)
Por AFP |
LONDRES – Apenas dois anos atrás, Lucas Cantero não sabia nada de música.
Em 25 de janeiro, o paraguaio de 16 anos tocou seu tambor — feito de madeira de paletes descartada, painéis de raio-X e hastes de cobre — no luxuoso palácio Lancaster House, em Londres.
"Nunca imaginei que de pedaços de madeira e raios-X pudesse sair música", disse o integrante da Orquestra de Instrumentos Reciclados de Cateura.
O conjunto jovem e pouco convencional recebeu o nome do maior aterro sanitário da capital paraguaia, Assunção.
![Integrantes da Orquestra de Instrumentos Reciclados de Cateura, do Paraguai, saem para se apresentar na Lancaster House, em Londres. [Justin Tallis/AFP]](/gc4/images/2025/01/30/48971-paraguay2-600_384.webp)
Os membros, moradores pobres de Assunção, fazem seus instrumentos com latas de tinta, canos, barris de óleo, escovas para sapatos e uma variedade de outros resíduos.
Eles produzem de tudo, de violinos a trompetes.
Cerca de 10 membros do grupo de 60 pessoas estavam em Londres, onde deslumbraram 200 convidados — diplomatas, parlamentares e empresários — no edifício do século 19 administrado pelo Ministério das Relações Exteriores da Grã-Bretanha, perto do Palácio de Buckingham.
Seu repertório vai de Mozart a Coldplay, passando por Beatles e Frank Sinatra.
O grupo foi lançado em 2007 e já se apresentou em cerca de 50 países.
"Criar uma banda com esses instrumentos reciclados chamou a atenção de muita gente", disse à AFP o diretor da orquestra, Flavio Chávez, 49 anos.
"Não só pelos instrumentos, mas também pelo talento desses jovens em transformar lixo em música."
Prevenção da violência
Chávez teve a ideia do projeto há quase duas décadas, quando foi trabalhar como técnico no aterro sanitário de Cateura.
"Também sou músico e comecei espontaneamente a dar aulas para as crianças da comunidade do aterro", explicou.
A ideia era atrair os adolescentes para a música e afastá-los da violência.
"É um bairro perigoso onde muitos acontecimentos fazem com que a pessoa mude, se torne má.", observou Cantero.
Eles começaram fazendo instrumentos "simples" para aprender, sem pensar no momento em que fariam concertos, disse Chávez.
Uma escola de música e uma orquestra acabaram surgindo.
A escola hoje ensina cerca de 450 crianças que, como Cantero, esperam progredir na orquestra.
"Eles aprendem praticamente do zero com a gente, a maioria deles, e ganham um lugar na orquestra", disse Chávez.
'Cama velha e escova'
Os adolescentes começam com "apresentações locais, primeiro no Paraguai, na comunidade de onde vêm, depois se inscrevem para formar a orquestra e depois fazem turnês pelo mundo", acrescentou.
Willian Wilson López, um dos 10 em Londres, lidera a equipe responsável pela fabricação de instrumentos de corda.
"Meu contrabaixo é feito de um barril de óleo, parte de uma cama velha e uma escova para sapatos", explicou.
"Nunca pensamos que isso criaria uma ponte que nos levaria tão longe", disse o ex-novato musical sobre a iniciativa comunitária.
A renda proveniente dos concertos da orquestra é parcialmente investida para ajudar a população carente de Cateura.
A iniciativa recebeu um grande impulso há cerca de uma década, quando o cineasta americano Graham Townsley lançou um documentário sobre o projeto, "Landfill Harmonic".
Isso levou bandas de rock como Metallica e Megadeth a pedir para tocar com a orquestra.