Por Marisela Luzardo | 2024-10-14

CARACAS -- Oregime iraniano intensificou seus esforços para expandir sua influência na América Latina na última década, operando de forma silenciosa, mas metódica.

O Irã vem buscando formar alianças na América Latina com países que compartilham sua retórica antiocidental e sua visão de uma ordem global alternativa, de acordo com um estudo publicado pela plataforma Diálogo Político no fim de maio.

Essa abordagem anteriormente não era prioritário para a política externa iraniana. No entanto, com a ascensão, no final dos anos 1990, de líderes como Hugo Chávez naVenezuela, o Irã encontrou uma oportunidade para formar alianças estratégicas na região.

A relação entre o Irã e a Venezuela, inicialmente impulsionada por sua participação conjunta na Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), fortaleceu-se ao longo dos anos, principalmente em resposta às sanções econômicas impostas a ambas as nações.

Mahmoud Ahmadinejad, líder do Irã de 2005 a 2013, foi fundamental no aprofundamento dos laços com a Venezuela e na expansão da influência do Irã em outros países da região.

O relatório do Diálogo Político destaca que a América Latina, antes desconhecida pelo público iraniano e vice-versa, surgiu como uma região promissora para o Irã cultivar alianças que se opõem à influência ocidental.

Esse novo foco na região abriu caminhos para parcerias estratégicas e a cooperação política.

Influência da língua espanhola

Um elemento-chave dessa estratégia foi a criação, em 2012, da HispanTV, um canal de notícias em espanhol com o objetivo de disseminar a narrativa do regime iraniano por toda a América Latina.

Junto com a PressTV do Irã em inglês, a HispanTV foi criada como uma ferramenta de soft power, usando o espanhol para interagir com milhões de pessoas na América Latina.

Na época, Ahmadinejad deixou claro que o objetivo principal da HispanTV era ideológico, com o objetivo de desafiar as narrativas ocidentais e promover conexões entre o Irã e as comunidades de língua espanhola.

Isso foi confirmado ao Entorno por um antigo colaborador da HispanTV que participou dos estágios iniciais do projeto.

Ele observou que a linha editorial imposta por Teerã era "inflexível e firme", não deixando espaço para o "contrapeso informativo" que os padrões jornalísticos normalmente exigem ao abordar diversas questões.

"Não se podia ter a fonte do outro lado para equilibrar questões sensíveis", disse a fonte, que pediu anonimato. "O discurso pró-Irã ou pró-China sempre estava presente na agenda de trabalho, mesmo em momentos polêmicos envolvendo o Irã e a China no contexto global."

A política editorial da HispanTV evitava deliberadamente abordar questões globais relevantes que implicassem negativamente o Irã, a Rússia ou a China.

Em vez disso, de acordo com o antigo colaborador, que deixou o meio de comunicação há vários meses, "eles tentaram tapar o sol com a peneira ao apresentar temas triviais".

Desinformação e teorias da conspiração

Em julho, a ONG norte-americana Liga Antidifamação (ADL) divulgou um relatório detalhado sobre as atividades da HispanTV desde sua criação em 2012.

O relatório afirma que o canal "difunde e amplifica o ódio antijudaico, incita a violência, glorifica o terrorismo e se dedica à desinformação, às teorias da conspiração e revisionismo histórico".

Embora a empresa espanhola de satélite Hispasat tenha excluído a HispanTV de seu serviço em dezembro de 2013 e o YouTube tenha bloqueado seu canal diversas vezes até determinar sua proibição total em fevereiro de 2020, as mensagens da HispanTV continuam chegando ao público latino-americano por meio de outros serviços de televisão via satélite, plataformas de streaming como Roku e contas de redes sociais associadas.

Para atacar esses problemas, a ADL recomendou que as plataformas de redes sociais mantenham equipes competentes de moderação de conteúdo em espanhol, com a orientação prioritária de limitar a retórica de ódio diante do recente aumento do antissemitismo.

O domínio da HispanTV continua ativo, mesmo após o Departamento de Justiça dos EUA apreender o domínio de seu canal parceiro, o PressTV.com, em junho de 2021, junto com outros 32 sites de notícias afiliados ao governo iraniano, devido ao seu envolvimento em "campanhas de desinformação e operações de influência maligna".

A estratégia cultural e de mídia do Irã faz parte de uma tendência mais ampla na região.

Outros países, como Rússia e China, também adotaram abordagens semelhantes, utilizando seus próprios canais de notícias para expandir sua influência através de propaganda na América Latina.

Mas, segundo o relatório do Diálogo Político, as mudanças políticas em países como Equador, Argentina e Uruguai, que se inclinaram para posições mais centristas ou de direita, dificultaram a expansão da influência iraniana na região.