Direitos Humanos
Católicos chineses temem represálias após viajar à Mongólia para ver o Papa
Na China, as organizações religiosas enfrentam perseguições rotineiras e a liberdade de culto é severamente restringida – uma tendência que se agravou sob o governo do presidente Xi Jinping.
![Fiéis chineses se reúnem em frente à Catedral de São Pedro e São Paulo, onde o Papa Francisco deverá aparecer durante sua visita à Mongólia, em Ulaanbaatar, em 2 de setembro. [Alberto Pizzoli/AFP]](/gc4/images/2023/09/05/43763-mongolia1-600_384.webp)
Por AFP |
ULAANBAATAR – Católicos chineses reuniram-se na capital da Mongólia para ver o Papa Francisco neste fim de semana, presenciando grandes expressões públicas de fé religiosa impensáveis no seu país e expressando esperança de que o pontífice possa um dia visitá-los.
A América Latina abriga 40% da população católica mundial, estimada em mais de 400 milhões, enquanto a China concentra cerca de 12 milhões de católicos.
Durante décadas, os católicos na China viram-se divididos entre o culto aprovado pelo Partido Comunista Chinês e as igrejas clandestinas apoiadas pelo Vaticano.
No fim de semana passado, com o papa à sua porta para a primeira visita papal à Mongólia, alguns viajaram para vê-lo com os próprios olhos.
![Papa Francisco abençoa uma criança em sua chegada para a Santa Missa na Steppe Arena, em Ulaanbaatar, no dia 3 de setembro. O papa destacou o poder da religião para resolver conflitos e promover a paz no seu último dia de visita à capital da Mongólia. [Pedro Pardo/AFP]](/gc4/images/2023/09/05/43764-vatican2-600_384.webp)
Na praça central de Ulaanbaatar, a AFP viu uma bandeira chinesa desfraldada, enquanto apoiadores se reuniam para ver o papa – vários deles usando máscaras e óculos de sol que escondiam seus rostos.
Uma visitante disse que ela e seus companheiros tinham de ser “muito discretos”.
“Na alfândega nos perguntaram por que estávamos (indo para o exterior) e se éramos católicos. Dissemos que estávamos aqui para viajar”, relatou.
Segundo ela, há “muita pressão sobre os católicos na China”.
"Também nos preocupa que, quando regressarmos, seremos convidados para 'conversas'", disse ela, usando um eufemismo comum para a convocação para interrogatórios por funcionários da segurança do governo.
A visitante contou que ela e um grupo de cerca de 20 pessoas tinham vindo do norte da China para ver o papa.
“Não nos atrevemos a falar sobre nossa viagem para outras pessoas”, afirmou.
O Partido Comunista é oficialmente ateu e exerce um controlo rigoroso sobre todas as instituições religiosas reconhecidas, o que inclui a verificação de sermões e a escolha de bispos.
O Papa Francisco liderou um esforço de anos para construir laços com Pequim e, em 2018, a Santa Sé chegou a um acordo sigiloso que permite a ambos os lados opinarem na nomeação de bispos na China.
Visitantes chineses na Mongólia disseram à AFP que esperam que esses laços possam ser fortalecidos -- e que o papa possa até mesmo visitá-los um dia.
“Espero que o papa venha à China”, afirmou à AFP uma católica de 75 anos de sobrenome Kong, que disse ter criado 48 órfãos sozinha.
Para ela, ambos os lados “deveriam conversar diplomaticamente”.
Embora não seja católico, Tamir Amarjargal, turista de 26 anos do interior da Mongólia, expressou esperanças semelhantes.
“É muito raro o papa visitar a Ásia”, disse.
"Perseguição rotineira"
“A Mongólia fica tão perto de nós, por isso estou aqui para vê-lo. Há vários católicos no meu grupo que estão muito entusiasmados para ver o papa pela primeira vez”, explicou.
"Espero que um dia ele possa visitar a China. Isso seria ainda melhor."
Lu Lei, 38 anos, engenheiro de petróleo da província de Heilongjiang, no norte da China, disse à AFP ter interesse na cultura católica, embora ele próprio não seja religioso.
Ele contou que, em preparação para a visita, assistiu ao drama televisivo "The Young Pope" -- série satírica sobre um pontífice americano conservador fictício, interpretado por Jude Law.
“Definitivamente, espero que o papa também nos visite na China”, disse ele.
“Cada país deve apoiar diferentes religiões e permitir que o seu povo escolha livremente a sua própria religião.”
A constituição chinesa garante a liberdade religiosa.
Mas grupos de defesa dos direitos humanos relatam que as organizações religiosas enfrentam perseguições rotineiras e que a liberdade de culto é severamente restringida – uma tendência que dizem ter piorado sob o governo do Presidente Xi Jinping.
“Não podemos entrar nas igrejas em dias sensíveis, como a Páscoa e o dia de Natal (devido à intimidação das autoridades)", disse uma visitante chinesa em Ulaanbaatar.
As autoridades dizem “uma coisa e fazem outra”, afirmou ela.
A AFP ouviu um visitante aconselhar outro a não falar com os repórteres, por medo de “problemas” no retorno à China.
“Acho que você sabe por que não podemos falar muito”, disse uma mulher que esperava na catedral.
"Você sabe como é."