Ambiente

Nova variedade resistente de arroz oferece esperança para o Chile afetado pela seca

Cientistas da região desenvolveram o 'Jaspe', uma variedade de arroz resistente que se desenvolve em condições difíceis. Os primeiros testes de um agricultor sugerem que pode ser um fator de mudança.

Trabalhador corta amostras de arroz nas plantações experimentais do INIA (Instituto de Investigação Agrária) em San Carlos, região de Ñuble. Como o Chile está passando por uma seca sem precedentes há cerca de 15 anos, a cientista Karla Cordero, do INIA, desenvolveu uma nova variedade de arroz resultante do cruzamento de uma semente chilena com outra de origem russa, mais adaptada a climas frios e secos. [Raúl Bravo/AFP]
Trabalhador corta amostras de arroz nas plantações experimentais do INIA (Instituto de Investigação Agrária) em San Carlos, região de Ñuble. Como o Chile está passando por uma seca sem precedentes há cerca de 15 anos, a cientista Karla Cordero, do INIA, desenvolveu uma nova variedade de arroz resultante do cruzamento de uma semente chilena com outra de origem russa, mais adaptada a climas frios e secos. [Raúl Bravo/AFP]

Por AFP |

ÑIQUÉN, Chile – Uma região fria e seca do Chile pode não parecer o melhor lugar para cultivar arroz, um grão famoso por sua sede que se desenvolve em condições tropicais.

Mas uma nova variedade do cereal mais popular do mundo, desenvolvida por cientistas do país sul-americano assolado pela seca, gerou a esperança de que o arroz possa crescer em condições aparentemente inóspitas.

Utilizando uma técnica de plantação inovadora, Javier Muñoz tem cultivado de maneira experimental a variedade “Jaspe”, criada pelo Programa de Melhoramento de Arroz do Instituto de Investigação Agrária (INIA).

Trata-se de um dos vários esforços de investigação em todo o mundo para criar culturas que consumam menos recursos, no momento em que a escassez de água aumenta em algumas partes do planeta.

Trabalhadores ensacam arroz colhido em Ñiquén, Chile. [Raúl Bravo/AFP]
Trabalhadores ensacam arroz colhido em Ñiquén, Chile. [Raúl Bravo/AFP]

A utilização de Jaspe em combinação com um método de cultivo que requer apenas rega intermitente reduz para metade o consumo de água da família Muñoz em um país que há gerações cultiva arroz em campos inundados ou arrozais.

Ao mesmo tempo, o rendimento disparou, com cada semente produzindo cerca de 30 plantas — quase 10 vezes mais do que um campo de arroz convencional.

Irrigar em vez de inundar os campos de arroz “é um passo histórico (...) em direção ao futuro”, disse Muñoz, 25 anos, à AFP em sua fazenda na região de Ñuble, a quase cinco horas de carro ao sul da capital Santiago.

No próximo ano, afirmou, ele espera aumentar sua área de produção de um hectare para cinco.

As regiões chilenas de Maule e Ñuble contêm os campos de arroz mais ao sul do mundo.

Normalmente cultivado em zonas tropicais mais úmidas, o arroz tem sido prejudicado por uma grande seca sem precedentes no Chile, que já está no 15º ano, segundo cientistas.

Cada chileno come em média 10 kg de arroz por ano — quase metade é cultivado internamente e 80% em campos inundados, de acordo com o centro de pesquisas SRI-Rice da Universidade de Cornell.

O método de inundação, que requer cerca de 2.500 litros de água por kg de arroz, é utilizado em todo o mundo para combater as ervas daninhas e regular a temperatura em torno de mudas vulneráveis.

Menos metano

A engenheira agrônoma do INIA, Karla Cordero, e seus colegas obtiveram a variedade de arroz Jaspe através do cruzamento de uma semente chilena com uma russa melhor adaptada a climas frios e secos.

A semente modificada é então cultivada utilizando a técnica SRI desenvolvida em Madagascar na década de 1980. Ela consiste em espaçar mais as mudas em solo enriquecido e regar apenas esporadicamente para construir um sistema radicular mais resistente.

Cordero apresentou os resultados de quase 20 anos de experiências — realizadas com o apoio do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura — durante uma Conferência Internacional de Pesquisa de Arroz em Manila, em 2023.

Os resultados ainda não foram publicados em nenhuma revista científica, mas o Serviço de Agricultura e Pecuária do Chile, um braço do Ministério da Agricultura, deu luz verde em 2023 para que a nova variedade de arroz branco de grão longo seja lançada comercialmente.

Além de utilizar menos água e menos sementes, o novo método Jaspe-SRI emite menos metano.

'Abordagem promissora'

Jaspe provou ser mais resistente a tempestades, inundações e ondas de calor.

“As plantas são muito mais robustas, o que permite a produção de arroz sem inundações”, disse Cordero.

Makiko Taguchi, especialista em cultivo de arroz da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, declarou à AFP que o trabalho chileno constitui “uma abordagem promissora para melhorar a produção de arroz e reduzir o impacto ambiental”.

Os resultados sugerem que a abordagem poderia funcionar em outras partes do mundo “onde são produzidas grandes quantidades de arroz e onde há secas”, disse Cordero.

A equipe espera testar o Jaspe em breve no Brasil — maior produtor de arroz da região — e em outros países da América do Sul.

“Este é o futuro”, disse Muñoz. “Se queremos (...) segurança alimentar e nos preocupamos com o meio ambiente, este é o caminho.”

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