Segurança

Colômbia paga jovens em situação de risco para 'não matarem'

Várias regiões da Colômbia continuam sendo vítimas de conflitos violentos entre grupos criminosos, deixando cicatrizes de longo prazo nas crianças que crescem nesses ambientes.

Franklin Mina trabalha em sua papelaria em Buenaventura, na Colômbia. Um dos maiores portos do país, Buenaventura é palco de uma batalha feroz entre gangues. [Luis Acosta/AFP]
Franklin Mina trabalha em sua papelaria em Buenaventura, na Colômbia. Um dos maiores portos do país, Buenaventura é palco de uma batalha feroz entre gangues. [Luis Acosta/AFP]

Por AFP |

BUENAVENTURA, Colômbia – Por ter crescido em um bairro colombiano violento, governado por criminosos e pelas leis da máfia, Franklin Mina estava destinado a se tornar membro de gangue.

Em vez disso, o jovem de 27 anos hoje estuda serviço social em uma faculdade técnica e dirige um pequeno negócio em Buenaventura, região assolada pela violência de grupos criminosos situada na costa do Pacífico da Colômbia.

Mina é beneficiário de um novo plano governamental que paga jovens colombianos de 14 a 28 anos moradores de áreas de risco para se afastarem da criminalidade.

Ele recebe o equivalente a cerca de US$ 250 por mês, com os quais comprou um computador, uma impressora e material para abrir uma papelaria.

Patricia Riascos caminha em Buenaventura, na Colômbia. [Joaquín Sarmiento/AFP]
Patricia Riascos caminha em Buenaventura, na Colômbia. [Joaquín Sarmiento/AFP]
Cristina Martinez posa para foto em Buenaventura, na Colômbia. [Joaquín Sarmiento/AFP]
Cristina Martinez posa para foto em Buenaventura, na Colômbia. [Joaquín Sarmiento/AFP]

"Desde criança sei o que é uma arma, o que é uma bala", disse Mina à AFP sobre a infância em Buenaventura, no departamento de Valle de Cauca.

Como muitas outras na Colômbia, a cidade de 324.000 habitantes está exposta a uma disputa violenta entre gangues criminosas.

Esse tipo de infância, segundo Mina, “deixa sequelas que afetam um jovem ser, o seu pensamento".

'Para minha família'

Ao lançar o programa “Juventude em Paz”, no ano passado, o presidente colombiano, Gustavo Petro, disse que milhares de jovens colombianos com poucas opções, como Mina, receberiam dinheiro “para não matar, para não participar da violência, para estudar”.

O governo não informou o valor destinado à iniciativa nem a duração do programa.

Desde o início do projeto, em outubro passado, quase 3.000 jovens colombianos se tornaram beneficiários.

Alguns vivem em grandes cidades como Bogotá, a capital do país, e Medellín, onde o governo negocia a paz com grupos de narcotráfico herdeiros do império da cocaína do chefão Pablo Escobar.

Outros vêm de assentamentos menores nos departamentos de Cauca e Valle del Cauca, onde gangues e outros grupos armados se financiam com tráfico de drogas, extorsão e outros negócios ilegais.

Em Buenaventura, onde a maioria dos habitantes é de ascendência africana, cerca de 40% dos moradores vivem na pobreza e um em cada quatro está desempregado.

Muitos jovens não têm outra alternativa a não ser ingressar no mundo do crime – seja por escolha própria ou pela força.

“Consegui investir o dinheiro [do subsídio]... para gerar renda não só para mim, mas também para minha família”, disse Mina, que investe parte do benefício nos estudos.

Muitos amigos e familiares, contou ele, não tiveram tanta sorte e acabaram nas garras de gangues.

“Esperamos que isso [o programa] possa ser ampliado e gerar oportunidades para outros jovens como eu”, disse ele à AFP.

'Queremos mudar'

Para ter direito ao subsídio, os beneficiários devem estar em situação de pobreza e viver sob alto risco de serem recrutados por grupos criminosos.

Também não podem ter mandados de prisão em aberto.

Eles recebem o subsídio por até 18 meses, e o pagamento pode ser interrompido se o beneficiário tiver problemas com a lei ou parar de frequentar as aulas, por exemplo.

O projeto também é alvo de críticas.

A oposição na Colômbia afirmou, sem fornecer provas, que o programa, na verdade, é um artifício para financiar grupos armados com dinheiro estatal.

Também alegou corrupção na seleção dos beneficiários.

Petro tenta libertar a Colômbia de seis décadas de conflito armado entre guerrilhas de esquerda, paramilitares de direita, cartéis de droga e militares.

O presidente busca negociar a paz com vários grupos, ao mesmo tempo que ataca as causas profundas da violência com projetos como o "Juventude em Paz".

Para Mina, a violência “é um problema estrutural". "Mas este é o início para podermos nos transformar”, disse.

Outra beneficiária de Buenaventura, Patricia Riascos, estudante de hotelaria e turismo de 21 anos, disse que usa o dinheiro do subsídio para pagar o transporte para as aulas.

Ela também ajuda seu irmão menor, o qual tenta desesperadamente afastar da criminalidade.

"Somos pessoas que correm o risco de virar bandidos, mas na verdade não somos bandidos", contou à AFP.

"Somos pessoas que querem mudar de vida."

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