Sociedade

Seca na Amazônia revela gravuras antigas no Brasil

Maioria das ilustrações são de rostos humanos, alguns de formato retangular e outros ovais, com sorrisos ou expressões sérias.

O arqueólogo Jaime Oliveira, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, mostra gravuras rupestres antigas que ressurgiram devido à forte seca que assolou a região às margens do Rio Negro, em Manaus, no Brasil. [Michael Dantas/AFP]
O arqueólogo Jaime Oliveira, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, mostra gravuras rupestres antigas que ressurgiram devido à forte seca que assolou a região às margens do Rio Negro, em Manaus, no Brasil. [Michael Dantas/AFP]

AFP |

MANAUS, Brasil – Uma seca extrema em partes da Amazônia levou a uma queda dramática nos níveis das águas dos rios, expondo dezenas de formações rochosas geralmente submersas com gravuras de formas humanas esculpidas há cerca de 2.000 anos.

Lívia Ribeiro, moradora de longa data da maior cidade da Amazônia, Manaus, conta que soube das gravuras rupestres por meio de amigos e quis dar uma olhada.

"Achei que fosse mentira... Nunca havia presenciado isso. Vivo em Manaus há 27 anos", disse Ribeiro, um administrador, após ver as relíquias deslumbrantes.

As gravuras rupestres não costumam ser visíveis porque ficam cobertas pelas águas do Rio Negro, cujo caudal registrou na semana passada o nível mais baixo em 121 anos.

A última vez que as gravuras puderam ser vistas foi durante a grande seca de 2010. [Michael Dantas/AFP]
A última vez que as gravuras puderam ser vistas foi durante a grande seca de 2010. [Michael Dantas/AFP]
Antigas gravuras rupestres que ressurgiram na região do sítio arqueológico da Praia das Lajes. [Michael Dantas/AFP]
Antigas gravuras rupestres que ressurgiram na região do sítio arqueológico da Praia das Lajes. [Michael Dantas/AFP]

O surgimento das gravuras nas margens do rio encantou os cientistas e o público em geral, mas também levantou questões inquietantes.

“A gente pode vir, achar bonito. Mas muitas pessoas passam necessidade neste momento e a gente pensa nelas... Também imagino se, daqui a 50 ou 100 anos, este rio irá existir”, disse Ribeiro.

A seca na Amazônia brasileira reduziu drasticamente os níveis dos rios nas últimas semanas, afetando uma região que depende de um labirinto de vias fluviais para transporte e abastecimento.

O governo brasileiro enviou ajuda emergencial à região, onde as margens dos rios, normalmente movimentadas, estão secas e pontilhadas por barcos encalhados.

Segundo especialistas, a estação seca se agravou neste ano devido ao El Niño, um padrão climático irregular no Oceano Pacífico que impacta o clima normal, acentuando o efeito das alterações climáticas.

As gravuras constituem um sítio arqueológico de “grande relevância”, disse Jaime Oliveira, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

Elas estão no local conhecido como Praia das Lajes e foram descobertas em 2010, durante outro período de seca não tão grave quanto o atual.

O conjunto de rochas onde foram esculpidas é cercado, de um lado, por uma floresta densa e, de outro, pelas águas baixas do Rio Negro, de cor marrom.

A maioria das gravuras são de rostos humanos, alguns de formato retangular e outros ovais, com sorrisos ou expressões sérias.

“O sítio expressa emoções, sentimentos. É um registro rupestre, mas tem algo em comum com as obras de arte atuais”, disse Oliveira.

Para Beatriz Carneiro, historiadora e integrante do Iphan, a Praia das Lajes tem um valor “inestimável” para a compreensão dos primeiros povos que habitaram a região, um campo ainda pouco explorado.

“Infelizmente, as gravuras estão reaparecendo agora com o agravamento da seca”, disse Carneiro. “O que ajuda a preservar as gravuras é a gente poder ter de volta os nossos rios e manter esse processo submerso na natureza.”

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