Segurança

América Latina perde interesse em armas russas de difícil reparo e propensas a acidentes

Série de acidentes na América Latina e a falta de assistência e manutenção levantaram preocupações sobre as armas de fabricação russa.

Investigadores, membros da proteção civil e bombeiros observam os restos de um helicóptero Mi-17 de fabricação russa pertencente ao exército boliviano que caiu em Barquisimeto, Venezuela, em fevereiro de 2022. Uma série de acidentes na América Latina, além da falta de assistência e manutenção, levantou preocupações sobre armas de fabricação russa. [Artêmio Sequera/AFP]
Investigadores, membros da proteção civil e bombeiros observam os restos de um helicóptero Mi-17 de fabricação russa pertencente ao exército boliviano que caiu em Barquisimeto, Venezuela, em fevereiro de 2022. Uma série de acidentes na América Latina, além da falta de assistência e manutenção, levantou preocupações sobre armas de fabricação russa. [Artêmio Sequera/AFP]

Por Juan Camilo Escorcia |

BOGOTÁ — Nas últimas duas décadas, a Venezuela emergiu como o principal comprador de armas russas na América Latina.

Mas também experimentou a maior taxa de acidentes com helicópteros fabricados na Rússia na região.

Sete acidentes envolvendo a frota de helicópteros Mi-17 das Forças Armadas Nacionais Bolivarianas da Venezuela (FANB)foram registrados desde 2008, resultando em 47 mortes. O ano de 2022 foi o pior, com quatro acidentes e oito mortes.

As causas dos acidentes nunca foram divulgadas oficialmente.

Uma série de acidentes na América Latina, além da falta de assistência e manutenção, levantou preocupações sobre as armas de fabricação russa.
Uma série de acidentes na América Latina, além da falta de assistência e manutenção, levantou preocupações sobre as armas de fabricação russa.

Um helicóptero russo Mi-17 também foi responsável pelo acidente aéreo mais mortal da história do exército colombiano. Em junho de 2016, a aeronave caiu em uma área montanhosa no centro do país, matando cinco tripulantes e outros 12 militares.

Em menos de oito meses,dois acidentes envolvendo helicópteros Mi-17 nos Andes e na Floresta Amazônica mataram 10 militares peruanos.

A série de acidentes envolvendo helicópteros russos Mi-17 na América Latina levantou preocupações sobre a baixa qualidade e obsolescência das armas russas.

Além dos acidentes, a dificuldade de manutenção é um problema, segundo vários relatos.

Queda nas importações

Um artigo publicado pelaagência estatal de notícias russa Sputnikem 23 de janeiro destacou que oito países da América Latina obtiveram armamento russo entre 2000 e 2021.

"A Venezuela foi o país latino-americano que mais adquiriu armamento de Moscou", variando de sistemas de defesa aérea a helicópteros de combate e bombas guiadas, segundo a Sputnik, que foi sancionada pela União Europeia por espalhar desinformação sobre a invasão russa na Ucrânia.

A quantidade exata de armamentos é desconhecida, mas estima-se que chegue a bilhões de dólares.

A publicação, baseada em relatórios do Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo (SIPRI), também afirma que a Nicarágua foi o segundo maior comprador de armas russas na América Latina entre 2000 e 2021. O país adquiriu "pelo menos um helicóptero e 50 tanques T-72B, entre outras armas".

O Peru vem a seguir, tendo comprado mais de 32 helicópteros russos e mais de 200 mísseis ao longo de 21 anos.

“O México adquiriu pelo menos 30 sistemas de defesa aérea e nove helicópteros russos”, enquanto Cuba comprou um jato de combate MiG-29 e o Uruguai comprou “48 Vodniks, um veículo militar russo multipropósito altamente móvel”. A Argentina comprou "dois helicópteros russos modelo Mi-8MT/Mi-17", e a Colômbia adquiriu seis.

No entanto, uma publicação da BBC News de abril de 2022 revelou que as vendas de produtos militares russos para a América Latina despencaram entre 2017 e 2021.

A publicação atribuiu o declínio a razões econômicas, assim como à obsolescência do equipamento militar russo e à dificuldade de fazer reparos.

"Nos últimos cinco anos, houve um declínio muito acentuado nas vendas de armas russas para a América Latina. Na verdade, não há quase nada", disse à BBC Siemon T. Wezeman, pesquisador sênior do Programa de Transferência de Armas do SIPRI.

Segundo a BBC, a primeira década do século 21 viu um boom comercial na América do Sul, com fortes receitas de divisas que permitiram aos países da região equipar suas forças armadas. De fato, “a América do Sul foi a região do mundo onde os gastos militares mais cresceram em 2010, com o Brasil liderando esse fenômeno”.

A explosão comercial na América do Sul terminou abruptamente em 2014, quando o colapso das exportações de commodities levou a um aperto fiscal na região. Isso, somado à ausência de conflitos entre os países da região, resultou em uma redução na compra de armas.

Consequentemente, entre 2017 e 2021, as importações de armas pelos estados sul-americanos atingiram seu nível mais baixo em 50 anos, disse a BBC, citando dados do SIPRI.

Apesar da queda nas importações de armas, a BBC enfatizou que os países latino-americanos continuaram comprando e recebendo equipamentos militares de vários outros países, incluindo Estados Unidos, Suécia, Itália, França e Coreia do Sul, enquanto "pararam de comprar da Rússia".

Outros motivos para a queda na demanda

Espera-se que a demanda por armas russas por alguns países continue caindo em razão das "sanções comerciais impostas à Rússia e da pressão crescente" da União Europeia, dos Estados Unidos e de seus aliados para não comprarem armas russas, de acordo com Wezeman.

Wezeman acrescentou que a queda nas exportações de armas russas também resultaria da necessidade do Kremlin de "dar prioridade ao fornecimento para suas forças armadas", por conta da invasão na Ucrânia.

As forças armadas russas sofreram grandes perdas na Ucrânia, e o Kremlin agora se concentra em reabastecer seus estoques de armas e munições.

Outro acidente recente na América Latina destacou os perigos de comprar dos russos.

Em 16 de junho, um helicóptero russo Mi-17 caiu em Temamatla, poucos quilômetros ao sul da Cidade do México, matando dois militares mexicanos. Esse foi o quarto acidente envolvendo helicópteros russos no México desde 2019 e dificilmente será o último na América Latina.

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