Energia
Painéis solares chineses sob escrutínio por receio de sistemas de comunicação ocultos
Inversores solares de fabricação chinesa instalados em toda a América Latina podem abrir a porta para sabotagem ou vigilância remota nas redes de energia renovável em expansão na região.
![Operários carregam painéis solares para serem instalados no projeto fotovoltaico de 1 milhão de kW de Ningguoyun Lingwu, no deserto de Lingwu, na região de Ningxia, China. [AFP]](/gc4/images/2025/06/18/50875-solar_-600_384.webp)
Por Entorno |
CIDADE DA GUATEMALA/BOGOTÁ – A crescente dependência latino-americana de painéis solares fabricados na China tem despertado novas preocupações entre os especialistas em segurança, após a descoberta de dispositivos de comunicação não autorizados embutidos em inversores solares nos Estados Unidos.
As revelações, noticiadas pela Reuters em maio, sugerem que estes componentes, essenciais para os sistemas de energia solar, podem ser manipulados remotamente, constituindo uma ameaça à segurança nacional. Na América Latina, onde as empresas chinesas dominam o setor das energias renováveis, cresce o receio de que riscos semelhantes possam já estar presentes.
"Tudo é possível quando se trata da presença da China na América Latina", disse ao Entorno Pedro Trujillo, analista de defesa guatemalteco e ex-diretor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Francisco Marroquín, na Cidade da Guatemala. "Já vimos balões espiões sobrevoando a região, a tentativa da Huawei de controlar as telecomunicações e os esforços para administrar portos estratégicos."
Neste contexto, “o impulso energético da China pode também servir como um cavalo de Troia para a espionagem ou a sabotagem”, disse ele.
Os inversores, majoritariamente fabricados na China, ligam os painéis solares e as turbinas eólicas às redes elétricas nacionais. São utilizados em sistemas de baterias, carregadores de veículos elétricos e bombas de calor. Se forem comprometidos, podem prejudicar o fornecimento de energia ou danificar infraestruturas críticas, dizem os analistas.
A instalação generalizada de inversores chineses representa “uma clara ameaça continental, primeiro para os EUA, mas também para as nações latino-americanas, agora profundamente inseridas na cadeia de fornecimento da China”, explicou Trujillo.
O debate sobre segurança surge em meio a um aumento das tensões diplomáticas entre Pequim e Guatemala, após a visita do presidente Bernardo Arévalo a Taiwan e ao Japão, ato que provocou forte reação da China.
Expansão solar e influência chinesa
A Colômbia, um dos mercados de energia solar de maior crescimento na região, se destaca como uma área-chave para o investimento chinês. A Trina Solar, uma empresa chinesa que se encontra entre os principais fabricantes de painéis solares do mundo, aumentou suas operações no país sul-americano.
No departamento colombiano de Meta, a companhia opera os projetos Bosques de los Llanos 4 e 5, com uma capacidade combinada de 52,4MW e investimentos superiores a US$ 3,4 milhões. Em 2019, a Trina ganhou três contratos governamentais no primeiro leilão de energia renovável da Colômbia, totalizando quase 350MW.
No fim de 2024, a capacidade solar instalada na Colômbia atingiu 1.928 MW, representando 9% da produção nacional de energia, de acordo com um relatório recente do Instituto do Ambiente de Estocolmo.
“A energia solar é o segmento que mais cresce no setor energético da Colômbia”, disse o acadêmico local Ignacio Acero, destacando que essa tendência torna o país um destino cada vez mais atraente para as empresas globais de energia fotovoltaica.
Comunicação ou controle?
A conectividade remota é uma caraterística padrão da infraestrutura solar moderna, salientou ao Entorno Carlos Rivera, engenheiro colombiano de energia renovável.
“Estes sistemas são concebidos para se comunicarem através da internet, tanto local como remotamente”, disse ele. “A questão não é a existência de comunicação; é quem a controla.”
Se os dispositivos tiverem configurações ocultas, podem ser acessados por pessoas não autorizadas. “É aí que reside o verdadeiro perigo”, alertou ele.
Para reduzir os riscos, ele defende uma supervisão mais rigorosa e regulamentos que garantam que qualquer transmissão de dados permaneça sob o controle exclusivo do proprietário ou operador do sistema.
À medida que a infraestrutura solar continua se expandindo na América Latina com apoio da China, as autoridades regionais enfrentam agora um desafio complexo: como acelerar a transição para a energia limpa sem entregar o controle de suas redes.