Crime e Justiça
Como o Equador se tornou um dos países mais violentos da América Latina
Inteligência militar identificou 26 gangues de narcotraficantes fortemente armados operando no país com números que, segundo especialistas, talvez possam rivalizar com os 60.000 policiais do Equador.
![Mulher chora do lado de fora da prisão Guayas 1 após confrontos entre presidiários em Guayaquil, Equador, em 23 de julho de 2023. A violência ligada às drogas no Equador no ano passado elevou a taxa de homicídios para 26 por 100.000 habitantes, quase o dobro do nível do ano anterior. [Gerardo Mescal / AFP]](/gc4/images/2023/08/14/43467-ecuador1-600_384.webp)
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QUITO — Há poucos anos, o Equador era uma ilha de paz espremida entre a Colômbia e o Peru, os maiores produtores mundiais de cocaína.
Mas, desde 2018, as apreensões de drogas e os homicídios aumentaram de forma alarmante, atribuídos em grande parte a grupos do crime organizado transnacional.
O assassinato, em 9 de agosto, do candidato de centro Fernando Villavicencio — até então o segundo nas pesquisas voltadas à eleição presidencial de 20 de agosto — abalou profundamente o país.
Seis colombianos foram presos por ligação com o ataque ocorrido durante um comício de campanha, e um sétimo morreu em um tiroteio com agentes de segurança.
![Membros das Forças Armadas do Equador montam guarda do lado de fora da Penitenciária Zonal nº 8 de Guayaquil, Equador, durante operação conjunta entre a Polícia e o Exército em 12 de agosto de 2023. Uma força conjunta de 4.000 homens realizou uma operação de segurança na prisão em meio ao estado de emergência declarado no país em 10 de agosto, após o assassinato do popular candidato à presidência Fernando Villavicencio. [Gerardo Mescal / AFP]](/gc4/images/2023/08/14/43468-ecuador_3-600_384.webp)
A violência ligada às drogas no Equador no ano passado elevou a taxa de homicídios para 26 por 100.000 habitantes, quase o dobro do nível do ano anterior.
O presidente Guillermo Lasso, que tem lutado contra o narcotráfico, mas não conseguiu conter a violência crescente, acusou o "crime organizado" de matar Villavicencio, um ex-jornalista que denunciou corrupção e recebeu ameaças de morte da gangue de narcotráfico conhecida como Los Choneros.
O ministro do Interior, Juan Zapata, disse que há mais de 13 grupos do crime organizado operando no Equador, sendo o mais antigo e poderoso deles o Los Choneros, agora aliado do cartel de Sinaloa do México.
Mas a inteligência militar do país diz ter identificado até 26 gangues de narcotraficantes ativas, que estão fortemente armadas e com números que, segundo especialistas, talvez rivalizem com os 60.000 policiais do Equador.
Analistas disseram à AFP que as guerras contra as drogas no México e na Colômbia pressionaram os cartéis desses países — assim como as máfias albanesas —, levando-os a estabelecer operações no Equador.
Para os narcotraficantes, os portos do Equador no Pacífico oferecem pontos úteis para a exportação de cocaína à Europa e aos Estados Unidos.
As gangues também foram atraídas pelas fronteiras porosas do país, pela economia dolarizada, pela corrupção disseminada e pela falta de controles sobre lavagem de dinheiro, segundo os especialistas.
"Violência extrema"
Jorge Restrepo, diretor do think tank colombiano CERAC, disse que os cartéis conseguem operar no Equador "com um custo de produção menor".
“A política de combate ao crime organizado no Equador não impediu que as forças do governo e o sistema judiciário fossem infiltrados pelo crime organizado ligado ao narcotráfico”, disse ele à AFP.
Luis Cordova Alarcon, que dirige um programa sobre conflito e violência na Universidade Central do Equador, liga o início da "violência criminosa extrema" a um atentado mortal com carro-bomba em janeiro de 2018.
O ataque destruiu parcialmente um posto policial e feriu 23 pessoas em uma cidade na fronteira com a Colômbia.
A autoria foi atribuída a um dissidente do grupo guerrilheiro colombiano FARC, que assassinou três jornalistas que trabalhavam para o jornal El Comercio de Quito e foi morto naquele ano por seguranças colombianos.
O ataque com carro-bomba foi seguido por massacres sangrentos na prisão entre gangues rivais de narcotráfico que deixaram 430 detentos mortos nos três anos seguintes.
Assim como no México, os equatorianos começaram a ver corpos desmembrados deixados nas ruas, cadáveres pendurados em pontes e sequestros por resgate em que os criminosos cortavam os dedos ou as orelhas das vítimas.
Entre as vítimas da violência no Equador estão prefeitos, juízes, promotores e dezenas de civis inocentes.
As apreensões de cocaína, porém, têm aumentado continuamente.
Especialistas dizem que o número crescente de apreensões e repressões policiais nas prisões de onde operam muitos líderes de gangues de drogas só pioraram a situação.
“O Equador está se tornando cada vez mais violento devido à forma como o Estado intervém com suas forças de segurança, capturando os líderes e aumentando as apreensões de cocaína”, disse Cordova Alarcon.
Os criminosos ficam mais violentos à medida que defendem seus negócios, além de outras atividades ilegais, como mineração ilícita de ouro e tráfico de armas, disse ele.
“O crime organizado já está tomando conta do estado”, acrescentou.