Economia

Brasil investiga suposta concorrência desleal da indústria chinesa de fibra ótica

O governo chinês dá bilhões de dólares em subsídios para empresas nacionais, o que lhes possibilita praticar ofertas mais baixas no exterior e obter uma vantagem competitiva injusta.

As subsidiárias brasileiras de três empresas apresentaram queixa alegando que a prática "injusta" de Pequim de subsidiar fabricantes chineses de cabos de fibra ótica reduzia muito os preços e tornava seus produtos menos competitivos. [Governo Brasileiro]
As subsidiárias brasileiras de três empresas apresentaram queixa alegando que a prática "injusta" de Pequim de subsidiar fabricantes chineses de cabos de fibra ótica reduzia muito os preços e tornava seus produtos menos competitivos. [Governo Brasileiro]

Por Waldaniel Amadis |

SÃO PAULO – O Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) do Brasil abriu uma nova investigação sobre suposta prática de dumping pela China nas exportações de cabos de fibra ótica.

Esta é a segunda investigação de dumping envolvendo a China no mercado de cabos de fibra ótica em menos de um mês.

No final de junho, o MDIC confirmou ao Entorno que havia iniciado uma investigação preliminar com base em uma segunda denúncia apresentada por três fabricantes locais: a empresa mexicana Cablena; a Prysmian Brasil, subsidiária da multinacional italiana Prysmian; e a japonesa Furukawa.

As subsidiárias brasileiras de três empresas apresentaram uma nova denúncia alegando que a prática "injusta" de Pequim de conceder subsídios a fabricantes chineses de cabos reduziu os preços e tornou seus produtos menos competitivos entre julho de 2021 e junho de 2022.

Cabos de fibra ótica no Brasil. [Governo Brasileiro]
Cabos de fibra ótica no Brasil. [Governo Brasileiro]

De acordo com a denúncia, que trata especificamente da questão dos "subsídios", a prática violou regras da Organização Mundial do Comércio.

O MDIC explicou que a investigação para confirmar a denúncia “pode levar até seis meses”.

Distorcendo a economia brasileira

O Departamento de Defesa Comercial do MDIC, conhecido como Decom, anunciou, através do Diário Oficial da União, no fim de junho, a abertura de uma investigação sobre supostos subsídios do governo chinês a fabricantes de cabos de fibra ótica.

Segundo o Decom, os subsídios podem "distorcer" a economia brasileira em "longo prazo".

Uma primeira investigação "genérica" foi aberta em maio pelo mesmo motivo e apresentada pelas mesmas empresas reclamantes, conforme noticiado pelo jornal Folha de S.Paulo.

Após a abertura da primeira investigação, representantes do governo chinês entraram em contato com seus colegas brasileiros e pediram que o caso não fosse levado a tribunais de arbitragem comercial internacional.

O governo chinês respondeu que seus fabricantes estatais de cabos de fibra ótica "seguem as regras do livre mercado", segundo a Folha de S. Paulo.

Os subsídios oferecidos por Pequim permitiram que empresas estatais e não estatais chinesas oferecessem seus produtos a preços reduzidos em relação ao mercado internacional e ganhassem licitações em vários países do mundo.

Esses subsídios garantiram às empresas estatais e privadas chinesas uma vantagem significativa no mercado global. Ao oferecer seus produtos a preços reduzidos, essas empresas têm conseguido vencer licitações em países de todo o mundo, mesmo quando seus produtos não são da mais alta qualidade.

Essa prática pressionou os fabricantes locais de outros países, que lutam para competir.

"A China nega que suas empresas estatais e bancos comerciais controlados pelo Partido Comunista da China (PCC) sejam considerados entidades públicas", disse a especialista em comércio exterior Teresa Franco.

No entanto, afirmou ela ao Entorno, "mesmo muitas das empresas apresentadas como 'privadas' levantam suspeitas de que são controladas pelo governo".

A "questão de a China ser uma 'economia de mercado' ou não, o que é uma discussão mundial, não é o que interessa às empresas reclamantes no momento", disse Franco.

Segundo ela, as empresas querem apenas "uma compensação pelos benefícios que suas concorrentes", as chinesas ZTT e FiberHome Telecommunication Technologies, recebem de Pequim, que torna seus preços os mais baixos do mercado.

Vantagem injusta

De acordo com a denúncia, ambas as empresas chinesas obtiveram incentivos financeiros do governo, incluindo empréstimos bancários em condições especiais e descontos em energia elétrica. A fabricação de cabos de fibra ótica usa muita energia elétrica.

Esses incentivos deram às empresas chinesas uma vantagem significativa sobre seus concorrentes brasileiros, que não receberam o mesmo nível de apoio do governo.

Em maio, o MDIC publicou uma circular com base na primeira denúncia, apontando que uma tonelada de cabos brasileiros para exportação custa US$ 9.234. Em contrapartida, as empresas chinesas cobram US$ 2.580 por tonelada, menos de 28% do preço brasileiro.

Essa significativa diferença de preço sugere que as empresas chinesas podem estar se beneficiando de subsídios injustos.

A China tem se defendido dessas acusações dizendo que a produção brasileira não consegue suprir 50% da demanda local. O governo chinês também apontou que o mercado brasileiro de cabos de fibra ótica cresceu 55,9% entre 2018 e 2022, para 45,7 milhões de usuários. Esse crescimento, diz o governo chinês, exige que os fornecedores chineses atendam à demanda.

A China também alegou que nenhuma das três empresas reclamantes é "brasileira", por serem subsidiárias de multinacionais estrangeiras. Esse aspecto, argumenta a China, impediria que fossem abrangidas pelos mecanismos de defesa antidumping do MDIC.

De acordo com um estudo do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais, think tank baseado em Washington, o governo chinês destina anualmente centenas de bilhões de dólares em subsídios para empresas domésticas selecionadas.

Esses benefícios, que incluem subsídios diretos, empréstimos abaixo da taxa de mercado, vendas de terras, incentivos fiscais e capital de fundos de investimento estatais, permitem às empresas oferecer propostas mais baixas no exterior do que suas contrapartes estrangeiras. Como resultado, as empresas obtêm uma vantagem competitiva no mercado global, afirma o estudo.

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